Consultor Jurídico

Fabio Assis: Desdobramentos tributários de esquema de pirâmide 16483u

16 de fevereiro de 2023, 13h14 4s706v

Por Fabio Roberto Tavares de Assis

imprimir

Há tempos que golpes e fraudes são efetuados no mercado mundial e, como não poderia ser diferente, no Brasil. O golpe que será objeto do estudo será o já conhecido e famigerado esquema Ponzi, ou mais conhecido como pirâmide financeira.

Importante notar que nesses esquemas, invariavelmente, a rentabilidade prometida é sempre fixa, mesmo que que os ativos subjacentes sejam criptomoedas, moedas estrangeiras e ações, sejam individualmente ou em conjunto. Logo, o investidor residente fiscal no Brasil, seria sujeito ivo de obrigação tributária em função do ganho de capital? Caso a resposta seja positiva, perceberia qual alíquota de Imposto de Renda? Qual seria o mecanismo de tributação? Em qual estágio do pseudo investimento este investidor se encontra e compensações com eventuais perdas seriam possíveis?

Para responder estas perguntas, é crucial conceituar o tipo de aplicação. Afinal, como o pseudo gestor de investimento promete a rentabilidade em diferentes classes de ativos, como tributar sob a ótica do investidor residente fiscal no país?

Conforme já exposto, nesses esquemas, a rentabilidade prometida é sempre fixa. No máximo, há uma maior rentabilidade percentual e, assim sendo, absoluta, em função do valor investido. Ou seja, quanto maior o valor, maior a rentabilidade.

Por vezes, são feitos contratos de prestação de serviços para terceirização de trader de criptoativos, mas o mais comum e não ter contrato. Somente há promessa de rentabilidade em função do valor aplicado. O leitor não terá dificuldade de encontrar tais promessas em sites de busca ou redes sociais.

Mesmo quando há contrato e este é travestido por um contrato de serviço, sua intenção é única e se traduz em uma promessa de rentabilidade fixa. Desta forma, no final do dia, o que temos é uma relação de mútuo¹. A denominação de mútuo é de suma importância e merece análise em artigo apartado. Como spoiler desta definição e futuro artigo, interessante ter em mente que a essência econômica deverá prevalecer sobre a forma jurídica.

Por último, mas não menos importante sobre a promessa da rentabilidade fixa, independentemente da forma jurídica de contrato, se houver, é, justamente, a promessa de rentabilidade fixa que traz contornos indiscutíveis sob a ótica tributária da pessoa física aplicadora residente fiscal.

Abordando o tema de forma pragmática, é necessário recorrermos a Instrução normativa RFB de Nº 1585, de 31 de agosto de 2015, onde:

"Art. 47. São também tributados como aplicações financeiras de renda fixa os rendimentos auferidos:

I – nas operações conjugadas que permitam a obtenção de rendimentos predeterminados, tais como as realizadas:

a) nos mercados de opções de compra e de venda em bolsas de valores, de mercadorias e de futuros (box);
b) no mercado a termo nas bolsas de que trata a alínea “a”, em operações de venda coberta e sem ajustes diários;
c) no mercado de balcão organizado;

II – pela entrega de recursos a pessoa jurídica, sob qualquer forma e a qualquer título, independentemente de a fonte pagadora ser ou não instituição autorizada a funcionar pelo Bacen;

III – nas operações de mútuo de recursos financeiros entre pessoas jurídicas ou entre pessoa jurídica e pessoa física;

IV – no reembolso ou na devolução dos valores retidos referentes ao IOF incidente nas operações com títulos ou valores mobiliários;

V – nas operações de transferência de dívidas realizadas com instituição financeira e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Bacen."

A parte legal grifada traz conclusão semântica que são equiparados aos rendimentos de aplicação financeira de renda fixa aquelas operações que possuem rendimentos predeterminados, não importando sua forma, o título e se a fonte pagadora, neste caso, o gestor, ser ou não autorizado a funcionar pelo Banco Central do Brasil.

Desta sorte, temos que remeter ao capítulo II da mesma instrução normativa, dado que a tributação seguirá o critério tributário de renda fixa. Buscando uma melhor exposição das resultantes deste cenário, a construção deste artigo seguirá no esquema de perguntas e respostas.

1. Qual seria a tributação das aplicações efetuadas?
Conforme artigo 46 da IN-RFB de nº 1.585 de 31/08/2015, temos:

I – 22,5% – em aplicações com prazo de até 180 dias;

II – 20% em aplicações com prazo de 181 dias até 360;

III – 17,5%, em aplicações com prazo de 361 até 720 dias;

IV – 15%, em aplicações com prazo acima de 720 dias.

Lembrando que para prazos indeterminados, a alíquota seria de 22,50%¹.

2 – Qual seria a base de cálculo?
Conforme o artigo 46 § 1º — A base de cálculo do imposto é constituída pela diferença positiva entre o valor da alienação, líquido do IOF, quando couber, e o valor da aplicação financeira.

3 – As reaplicações seriam tributadas?
Novamente o artigo 46 da IN-RFB de nº 1585 de 31/08/2015 elucida tal ponto:

"§ 3º A transferência de título, valor mobiliário ou aplicação entre contas de custódia não acarreta fato gerador de imposto ou contribuição istrados pela RFB, desde que:

I – não haja mudança de titularidade do ativo, nem disponibilidade de recursos para o investidor;"

Grifo nosso.

4 – Os rendimentos recebidos pelo aplicador deveriam ter sido tributados em caso de pagamento da rentabilidade? Ou seja, os rendimentos que de fato o aplicador recebeu, teve sensibilização em sua conta corrente, devem ser levados a tributação?
Novamente, o artigo 46 da IN-RFB de nº 1585 de 31/08/2015 vem ao socorro neste ponto.

§ 4º. Os rendimentos periódicos produzidos por título ou aplicação, bem como qualquer remuneração adicional aos rendimentos prefixados, serão submetidos à incidência do imposto sobre a renda na fonte por ocasião de seu pagamento, aplicando-se as alíquotas previstas neste artigo, conforme a data de início da aplicação ou de aquisição do título ou valor mobiliário.

Grifo nosso.

5. E quanto àqueles que perceberam rentabilidade e sacaram seus recursos antes da derrocada do gestor?
Neste caso, estes somente teriam a reclamar da empresa em função do não recolhimento do Imposto de renda na fonte. Caberia ao investidor, na qualidade de contribuinte, efetuar solução de consulta junto a Receita Federal para saber como proceder neste caso. Em virtude da mora dado o atraso do recolhimento contato a partir do fato gerador, buscar ressarcimento junto a empresa.

6. E quanto àqueles que perceberam rentabilidade parcial do valor investido sendo suficiente para recuperar o principal investido? Dado que parte da rentabilidade não foi percebida em função da derrocada da empresa, há compensação?
Não obstante a questão sobre as rendas auferidas no curso da aplicação e que não foram tributadas, embora tenham tido remuneração que a o capital investido, há recursos a receber. Neste caso, caberá ao investidor se habilitar para buscar o ressarcimento quando da execução dos bens arrestados e, posteriormente, penhorados.

No tocante ao imposto de renda, não há compensação para renda fixa de pessoa física. Este ponto já foi confirmado pela Receita Federal do Brasil através da Solução de Consulta nº 276 — Cosit, onde o artigo 76 da Lei nº 8.981, de 20 de janeiro é exposto de forma contundente.

"Art. 76. O imposto de renda retido na fonte sobre os rendimentos de aplicações financeiras de renda fixa e de renda variável, ou pago sobre os ganhos líquidos mensais, será:(Redação dada pela Lei nº 9.065, de 1995)

I – deduzido do apurado no encerramento do período ou na data da extinção, no caso de pessoa jurídica submetida ao regime de tributação com base no lucro real;

II – definitivo, no caso de pessoa jurídica não submetida ao regime de tributação com base no lucro real, inclusive isenta, e de pessoa física."

Grifo nosso.

7. E quanto àqueles que perceberam rentabilidade parcial do valor investido, mas não foi possível recuperar o principal aplicado?
O mesmo pensamento tributário se aplicará aos casos anteriores, assim como a habilitação para participar do concurso de credores.

8. Àqueles que não perceberam nenhuma remuneração
O investidor deverá se habilitar para participar do concurso de credores.

 

[1] IN-RFB de nº 1585 de 31/8/2015, art 47, § 4º. Nas operações de mútuo de recursos financeiros entre pessoas jurídicas ou entre pessoa jurídica e pessoa física em que o prazo de pagamento seja indeterminado, a alíquota do imposto sobre a renda na fonte será de 22,5%.