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Maioria do STF define que absolvições pelo Tribunal do Júri podem ser anuladas 2n551l

2 de outubro de 2024, 17h43 3x3u5k

Por Tiago Angelo

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É cabível recurso de apelação nas hipóteses em que a decisão do Tribunal do Júri, amparada em quesito genérico, revelar-se manifestamente contrária à prova dos autos.

Maioria entendeu que cabe recurso e novo júri em absolvições em contrariedade às provas baseadas em quesito genérico

O entendimento é do Plenário do Supremo Tribunal Federal, que formou maioria nesta quarta-feira (2/10) pela possibilidade de tribunais de segunda instância determinarem novo júri em caso de absolvição em contrariedade às provas dos autos, assentada em quesito genérico.

Prevalece a divergência do ministro Edson Fachin, com a tese proposta pelo ministro Alexandre de Moraes. O relator, ministro Gilmar Mendes, votou pela impossibilidade de recurso contra decisão absolutória por quesito genérico, mas ficou vencido.

Embora todos os ministros já tenham votado, falta a fixação da tese, o que deve ocorrer em data a ser marcada.

Repercussão geral 163f6o

O julgamento, de repercussão geral (Tema 1.087), envolve caso em que o conselho de sentença reconheceu a materialidade e a autoria de tentativa de homicídio, mas decidiu pela absolvição por clemência porque a vítima teria sido responsável por matar o enteado do acusado.

A apelação do Ministério Público foi rejeitada pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais. A corte entendeu que o princípio da soberania do júri impede a cassação da decisão.

De acordo com o TJ-MG, o sistema de íntima convicção, adotado nos julgamentos feitos pelo júri popular, ite a absolvição por quesitos genéricos, tais como clemência, piedade ou compaixão.

O MP-MG entrou com recurso no STF sustentando que a absolvição por clemência não é permitida no ordenamento jurídico e que ela significa a autorização para o restabelecimento da vingança e da justiça com as próprias mãos.

O julgamento foi iniciado no Plenário Virtual em 2020, mas recomeçou presencialmente após Alexandre pedir destaque.

Voto vencedor 2g174m

Fachin entendeu que a anulação de decisões absolutórias, com determinação de novo júri, não fere a soberania dos vereditos quando a decisão for tomada em contrariedade às provas dos autos. Foi acompanhado pelos ministros Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Luiz Fux e Luís Roberto Barroso.

Para Fachin, pode haver controle judicial mínimo sobre as decisões do júri. Segundo o ministro, embora o júri possa absolver com base em clemência, a decisão não pode contrariar princípios constitucionais nos casos que são insuscetíveis de graça, anistia ou perdão, como os crimes hediondos.

“Não se podendo identificar a causa de exculpação ou então não havendo qualquer indício probatório que justifique plausivelmente uma das possibilidades de absolvição, ou ainda sendo aplicada a clemência a um caso insuscetível de graça ou anistia, pode o Tribunal ad quem, provendo o recurso da acusação, determinar a realização de novo júri”, disse Fachin.

Ainda segundo o ministro, se os crimes hediondos são insuscetíveis de graça ou anistia, conforme a Constituição, os tribunais de segunda instância podem, sim, examinar se a decisão absolutória é compatível com o ordenamento constitucional.

“Como se observa da leitura dos fundamentos acolhidos, o recurso de apelação foi denegado, ante o reconhecimento da possibilidade de se conceder clemência ao acusado. Ocorre, no entanto, que a clemência que se reconheceu como sendo a causa de absolvição do júri recaiu sobre crime hediondo.”

Tese fica para depois 26ux

Inicialmente, Fachin propôs a tese de que é compatível com a soberania dos veredictos a anulação da absolvição baseada em quesito genérico quando há contrariedade às provas dos autos.

Depois, ele adotou a tese proposta por Alexandre de Moraes, que é mais sintética e tem a adesão da maioria do tribunal. Falta ainda a fixação porque o presidente da corte, Luís Roberto Barroso, propôs adendos à proposta de Alexandre e adiou a definição para que os ministros aprofundem a discussão.

A tese proposta por Alexandre, e seguida pela maioria até o momento, é a seguinte:

É cabível recurso de apelação nas hipóteses em que a decisão do Tribunal do Júri, amparada em quesito genérico, revelar-se manifestamente contrária à prova dos autos.

Relator 6g4i4k

Para Gilmar, relator do caso, a Constituição prevê a soberania dos vereditos, ao o que o Código de Processo Penal possibilita a absolvição por qualquer motivo a partir do quesito genérico. Ele foi acompanhado pelos ministros Celso de Mello, hoje aposentado, Cristiano Zanin e André Mendonça.

“Cumpre ressaltar que não há aqui qualquer favorecimento à impunidade de crimes graves. Na verdade, por um lado, trata-se de opção constitucional pela soberania dos veredictos. Por outro, de opção do legislador infraconstitucional pela estruturação no P de um sistema de julgamento por jurados sem qualquer necessidade de motivação da decisão tomada pelos leigos”, disse o ministro.

Ele discordou do argumento da Procuradoria-Geral da República de que é preciso respeitar o duplo grau de jurisdição e o direito ao recurso para a acusação, nos termos da Convenção Americana de Direitos Humanos. Segundo ele, a convenção prevê os direitos como sendo de titularidade da defesa, e não do órgão acusatório contra decisão absolutória.

“O direito ao recurso, nos termos convencionais, é de titularidade da defesa. Utilizar esse argumento para consolidar direito contra o réu caracteriza o que costuma se denominar de ‘efeito bumerangue’ de direito fundamental: casos em que os tribunais utilizam garantias do imputado para proferir uma sentença que lhe coloca em uma situação processual pior do que a anterior”, disse o decano do STF.

Gilmar, no entanto, afirmou que ficam ressalvados os casos em que for constatado que a conclusão dos jurados se deu a partir da tese da legítima defesa da honra em casos de feminicídio, considerada inconstitucional pelo Supremo em agosto de 2023.

Monopólio da clemência 17h3q

Zanin acompanhou Gilmar, mas propôs tese própria. Para o ministro, embora seja possível o recurso contra decisão absolutória, não pode haver apelação quando a absolvição ocorra por quesito genérico a pedido da defesa.

“O juiz que preside o Tribunal do Júri tem de exortar o jurado a fazer justiça. Essa é a previsão da lei: exortar o jurado a fazer justiça. Isso me faz crer que o quesito genérico contempla, sim, um pedido de clemência, desde que seja uma tese de defesa sustentada no Tribunal do Júri”, defendeu Zanin.

O ministro também lembrou que, no caso concreto, o Ministério Público só apelou contra uma absolvição por clemência, sem recorrer quanto ao outro réu.

Segundo ele, permitir novo júri em casos de absolvição por quesito genérico na prática dá ao MP a atribuição de clemência, já que o órgão pode recorrer de alguns casos e não de outros, como na discussão concreta.

“Se tirarmos dos jurados ou do Poder Judiciário a possibilidade de dar a clemência, quem ficará com essa atribuição ou poder será o Ministério Público, tal como aconteceu no caso dos autos. O MP aqui deu clemência a uma das rés ao não interpor apelação contra ela.”

ARE 1.225.185