Advogados e juízes divergem sobre buscas em escritórios
24 de julho de 2008, 20h42
Enquanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não sanciona nem veta o projeto que restringe as hipóteses de busca e apreensão em escritórios de advocacia, juízes, membros Ministério Público e advogados trocam farpas e divergem sobre as conseqüências do texto.
O Projeto de Lei 36/2006 altera o artigo 7º da Lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia) estabelecendo punição criminal para quem violar escritórios de advocacia. De um lado, o presidente nacional da OAB, Cezar Britto, ironizou nesta quinta-feira (24/7) o comentário do ministro da Justiça, Tarso Genro, que condicionou a sanção ao fato de ele “não trazer prejuízo à investigação criminal”.
“O presidente Lula pode sancionar com tranqüilidade o projeto de lei que estabelece a inviolabilidade dos escritórios de advocacia porque ele não estabelece habeas corpus preventivo para que advogados venham cometer crimes”, afirmou Britto. Já os juízes e procuradores da República afirmam que, pelo projeto, “mesmo se surgissem indícios veementes de que o local estaria sendo utilizado para ocultar a arma, um revólver ou uma faca utilizada para a prática de um homicídios”, não poderia ser violado.
Cezar Britto defendeu que o texto já foi aprovado por unanimidade no Congresso Nacional e estabelece, de forma expressa, que os operadores do Direito poderão ser investigados, quando acusados da pratica de crimes. “Crime existiria, única e exclusivamente, se o direito de defesa no Brasil fosse revogado pelo governo Lula”, completou.
Sobre a inviolabilidade do local de trabalho do advogado, o presidente da Ordem disse que o artigo 133 da Constituição Federal e o artigo 7º, inciso II, da lei da advocacia, asseguram o direito de defesa do cidadão. “Lula pode sancionar porque ele próprio já foi vítima no ado da mentalidade policialesca, em que uma simples reivindicação do trabalhador era considerada ofensiva à segurança nacional”, relembrou Britto.
Ele disse também que o novo projeto é apenas um reforço democrático por conta do que classificou de “arroubos autoritários que atingem algumas autoridades brasileiras”. O advogado criminalista David Rechulski afirmou que “é incrível observar, em pleno regime democrático, sob a gestão de governantes que outrora foram vítimas de arbitrariedades e autoritarismo de governos repressivos, que as garantias constitucionais estão sendo cada vez mais desrespeitadas, relegadas a um plano de menor importância. Faz parecer que estamos em vias de reeditar o AI-5!”.
Repercussão superior
Cezar Britto registrou ainda que o Supremo Tribunal Federal já apreciou o caso de violação de escritórios de advogados e que a garantia de direitos e a liberdade foram preservadas. Voto do ministro do STF, Eros Grau, no Habeas Corpus 89.025-3, examinado em 2006, discutiu a legalidade da utilização de e-mails trocados entre os advogados de defesa do banqueiro Edemar Cid Ferreira, do Banco Santos, como provas.
Os e-mails foram desconsiderados como provas. No entendimento do ministro Eros Grau, é de enorme gravidade a violação do computador do advogado para a averiguação do conteúdo de mensagens eletrônicas.
“A violação do computador utilizado pelo advogado, violação das mensagens trocadas entre ele e o paciente, é ilícita. A prisão preventiva não pode ser decretada com esteio em prova cuja licitude é questionada. Essa escalada de invasão de privacidade poderá nos levar, todos nós, a um triste destino. Triste e doloroso destino. Os próximos seremos nós’”, advertia Eros Grau.
Na mesma linha, o atual presidente do Supremo, ministro Gilmar Mendes, emendou que “tudo que se fala sobre estratégia de defesa restaria abalado a partir desse tipo de análise”.
Pelo veto
Se for sancionada como está, a lei permitirá que o crime fique “substancialmente mais fácil”, porque “os criminosos poderão fazer uso de escritórios de advocacia para esconder provas do cometimento de seus crimes, tornando-os imunes à ação da polícia, do Ministério Público e do Poder Judiciário”.
É o que afirmam entidades de classe de juízes de membros do Ministério Público sobre o texto. As associações enviaram nota técnica ao presidente Lula em defesa do veto ao projeto.
Na nota, as entidades reconhecem a necessidade de estudar a matéria, mas falam da necessidade de debater amplamente a proposta entre os poderes e a sociedade para “preservar a confiança da relação advogado-cliente, sem inviabilizar a persecução penal”.
A nota é assinada pela Associação dos Juízes Federais (Ajufe), Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), entre outras.
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