Relações de Consumo

Fazer festas clandestinas agora é crime

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  • é procurador de Justiça do MP-SP mestre pela USP doutor pela PUC autor de obras jurídicas ex-presidente da Assembleia Legislativa de SP presidente do Procon-SP e secretário de Defesa do Consumidor.

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29 de abril de 2021, 8h01

O Código Penal, no artigo 268, dispõe ser crime: "Infringir determinação do poder público destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa. Pena: detenção de 1 mês a 1 ano e multa". O crime está previsto em norma penal em branco ao quadrado, pois seu conteúdo é completado por duas outras normas em sequência, uma lei e, em seguida, uma portaria istrativa. A norma protege a saúde pública, procurando evitar a propagação de doença contagiosa. A Covid-19 é enfermidade viral contagiosa, enquadrando-se a situação prevista no tipo.

Para saber se há crime, é necessário conhecer qual é a determinação do poder público que está sendo violada. No caso, é a Lei 13.979/20, regulamentada pela Portaria 356/20, a qual impôs isolamento social e quarentena nas fases mais agudas da pandemia da Covid-19.

A norma é excepcional e só vale enquanto permanecer a proibição, cuja vigência está vinculada à gravidade da catástrofe humanitária da Covid-19. Cessando a proibição, desaparece o crime, pois, ao realizar a festa, não se estará mais violando determinação do poder público.

Assim, enquanto permanecerem os catastróficos efeitos da pandemia, perdurará a proibição e será crime afrontá-la. Observação: quem violar a proibição, continuará respondendo pelo crime, mesmo após a sua revogação, já que, na época, afrontou a regra de cautela sanitária.

Em São Paulo, foi criada uma força-tarefa formada pelas Polícias Civil e Militar, prefeitura, Vigilância Sanitária e Procon-SP com a finalidade de impedir e debelar festas e encontros que violam as regras de distanciamento social adotadas.

O crime é formal e de perigo comum, consumando-se independentemente da ocorrência de algum efetivo contágio. Basta o descumprimento da proibição.

É crime comum, não se exigindo do sujeito ativo nenhuma qualidade específica. Caso o autor seja profissional da área da saúde a pena poderá ser aumentada em um terço, em razão da maior reprovabilidade da conduta. O sujeito ivo é a coletividade, pois a violação põe em risco um número indeterminado de pessoas.

O elemento subjetivo do tipo é o dolo, consistente na vontade livre e consciente do agente em participar do evento, desobedecendo as regras de controle sanitário. O delito é de forma livre, não prevendo um modo específico para sua execução, podendo, portanto, ser cometido de qualquer maneira.

No que tange ao processo, trata-se de crime de ação penal pública incondicionada, processado perante o Jecrim em razão de ser crime de menor potencial ofensivo (pena máxima em abstrato não ser superior a dois anos — artigo 61 da Lei 9.099/95), itindo-se a transação penal com o Ministério Público.

Se o autor tiver se utilizado do descumprimento da norma sanitária preventiva para intencionalmente lesionar a saúde ou ceifar a vida de outrem, responderá pelo crime de infração de medida sanitária (artigo 268, ) em concurso com lesão corporal (artigo 129, ) ou homicídio (artigo 121, ).

Se houver intuito de lucro (festa paga ou gratuita com venda de bebidas), o organizador responderá pelo crime previsto no artigo 65 do Código de Defesa do Consumidor: "Executar serviço de alto grau de periculosidade, contrariando determinação de autoridade competente. Pena: Detenção de seis meses a dois anos e multa".

Serviço de alto grau de periculosidade é aquele que expõe a vida e a saúde do consumidor a risco iminente e grave. Trata-se de crime de perigo abstrato, não sendo necessário que o consumidor efetivamente sofra algum gravame para que se perfaça, bastando, dessa forma, a mera exposição do consumidor ao risco. Trata-se de crime de ação penal pública incondicionada, de menor potencial ofensivo, de competência para julgamento do Jecrim.

Além do crime, o fornecedor responderá ainda por multa de até R$ 10 milhões por violação ao artigo 39, VII, do Código de Defesa do Consumidor, que pune práticas abusivas.

Autores

  • é procurador de Justiça do Ministério Público de São Paulo, secretário estadual de Defesa do Consumidor e diretor executivo do Procon-SP, mestre pela USP, doutor pela PUC-SP, professor e autor de diversas obras jurídicas. Foi deputado estadual-SP por três mandatos, presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo, presidente do Colégio de Presidentes das Assembleias Legislativas do Brasil (2015-2017) e da Comissão de Justiça.

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