Plano de saúde deve cobrir mastectomia de homem transgênero, diz juíza
6 de dezembro de 2021, 9h45
A realização de mastectomia em homem transexual não pode ser considerada procedimento meramente estético, principalmente, quando houver indicação médica. Com esta fundamentação, a juíza Deborah Lopes, da 2ª Vara Cível Foro Regional de Penha de França, na Zona Leste de São Paulo, determinou que a Notre Dame Intermédica Saúde realize a cirurgia em paciente conveniado. A operação deve ocorrer na rede credenciada da ré, à escolha da parte autora, sob pena de multa diária.

O autor da ação foi representado pela advogada Bruna Cristina Santana de Andrade. Além da condenação do plano de saúde à obrigação de fazer, eles também pleitearam indenização por dano moral, porque o convênio teria negado indevidamente cobertura à cirurgia, conforme a petição inicial. Este pedido, no entanto, foi julgado improcedente, porque o paciente não comprovou a solicitação de liberação da cirurgia e, consequentemente, não ficou demonstrada a alegada omissão ilegal.
Em relação à operação, a juíza reconheceu comprovada a "indicação médica para a realização da cirurgia de mastectomia masculinizadora e a parte ré, citada, não impugnou de forma específica o mérito do pedido de cobertura". A juíza acrescentou que o plano de saúde não comprovou a exclusão contratual do procedimento solicitado, salientando ser conduta abusiva eventual limitação na cobertura, pois configuraria "exagerada restrição a direito fundamental inerente à própria natureza do contrato".
Esta abusividade na limitação contratual, que torna "nulas de pleno direito" as cláusulas restritivas, está prevista no artigo 51, inciso II, da Lei 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor). A juíza também citou o artigo 4°, caput, e incisos I, III, IV, referente aos princípios que regem a Política Nacional das Relações de Consumo, cujos objetivos são atender o respeito à dignidade, saúde e segurança dos consumidores, além de proteger os seus interesses econômicos e a melhoria da sua qualidade de vida, entre outros.
Advogada e autor
"A liberação da mastectomia é um direito assegurado há anos às pessoas transgêneras e o que verificamos, na condução diárias de processos como esses, é uma constante negativa dos planos de saúde. A sentença traz avanços, mas ainda deixa a desejar na falta de condenação por danos morais, porque os planos impõem um sofrimento desnecessário à população trans, ao negar uma cirurgia de extrema relevância", disse a advogada Bruna Andrade.
"A disforia com o gênero e o corpo de nascimento perseguem o autor desde o seu nascimento, situação que o faz submeter-se a constrangimentos pessoais e psicológicos, tendo em vista ter sido concebido em um gênero e um corpo nos quais o seu cérebro não identifica como verdadeiros", explicou a advogada. Segundo ela, para adequar o seu corpo ao sexo masculino, o autor se submete a procedimentos endocrinológicos e psicoterapêuticos.
Com 34 anos de idade, o autor já alterou seus documentos para o nome social que adotou. Ele disse que é "contraditória" a alegação do plano de que a mastectomia para seu o caso é um procedimento estético. "Se fosse só estético, eu ia no centro estético. Mas convênio é saúde, então se me é dado esse direito como todo cidadão, eu quero ter esse direito porque estou cuidando da minha saúde, mental e física. Já está mais do que comprovado que cirurgias retificadoras de gênero são uma questão de saúde e não estética".
1008449-77.2021.8.26.0006
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