Opinião

Rol de procedimentos da ANS: exemplificativo ou taxativo

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7 de março de 2022, 9h21

A 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) adiou novamente (23/2) o julgamento que definirá se a lista de procedimentos de cobertura obrigatória para os planos de saúde, instituída pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), é exemplificativa (permite eventual cobertura de itens fora da lista) ou taxativa (cobertura de itens somente da lista).

Atualmente, ainda que os planos de saúde não sejam obrigados a custear os procedimentos não previstos no rol, o caráter exemplificativo viabiliza a liberação por via istrativa ou judicial de procedimentos não descritos, vez que o entendimento predominante dos Tribunais pátrios considera como abusiva a negativa da cobertura pelo plano de saúde.

O julgamento teve início no mês de setembro do ano ado (2021) e abrange a análise dos recursos EREsp 1.886.929 e EREsp 1.889.704, ambos de relatoria do ministro Luis Felipe Salomão, o qual votou pela taxatividade do rol.

Em síntese, o relator argumentou que o rol de procedimentos objetiva a proteção dos beneficiários de planos, assegura a eficácia das novas tecnologias adotadas na área da saúde, pertinência dos procedimentos médicos e avaliação dos impactos financeiros para o setor. Contudo, ressalvou hipóteses excepcionais em que seria possível a cobertura, como terapias que têm recomendação expressa do Conselho Federal de Medicina (CFM) e possuem comprovada eficiência para tratamentos específicos, ou medicamentos relacionados as tratamento de câncer e prescrição off label (remédio usado para tratamento não previsto na bula).

Na mesma data em que iniciou, o julgamento foi suspenso em razão do pedido de vista da ministra Nancy Andrighi, sendo a sessão retomada no dia 23/02/2022.

Quando da retomada, a ministra Nancy Andrighi abriu divergência e considerou que o rol de procedimentos da ANS é exemplificativo. O voto-vista fundamentou-se na natureza de adesão dos contratos de planos de saúde, na vulnerabilidade do consumidor em relação às operadoras dos planos de saúde, nas dificuldades atinentes ao caráter técnico-científico adotado e que, segundo a ministra "não cabe à ANS estabelecer outras hipóteses de exceção da cobertura obrigatória pelo plano-referência, além daquelas expressamente previstas nos incisos do artigo 10 da Lei 9.656/1998, assim como não lhe cabe reduzir a amplitude da cobertura, excluindo procedimentos ou eventos necessários ao pleno tratamento das doenças listadas na CID, ressalvadas, nos termos da lei, as limitações impostas pela segmentação contratada".

Ainda, para a ministra, as relações jurídicas estabelecidas nos mercados de saúde suplementar devem ser em rol do interesse público, e ter como premissa a pessoa humana, não ao lucro. Não obstante, ressaltou que a legislação ampara as operadoras a proceder com eventuais reajustes, conforme aumento de sinistralidade, em que pese os dados demonstrem que nos últimos anos o cenário de aumento nos lucros e reduções dos sinistros.

O novo adiamento ocorreu após pedido de vista do ministro Villas Bôas Cueva, considerado coletivo, e o julgamento será retomado com a apresentação de seu voto-vista, ainda sem data definida.

Caso prevaleça o entendimento do relator, ainda que se sustente que a taxatividade visa a proteção do consumidor e a preservação do equilíbrio econômico do mercado de planos de saúde, a verdade é que o consumidor ará um demasiado retrocesso de seus direitos.

Tal situação prejudicará drasticamente aquelas pessoas portadoras de deficiências, doenças graves, raras, por exemplo, e que necessitam de sessões especiais e medicamentos caros, as quais possivelmente terão de pagar de forma particular ou se socorrer do Sistema Único de Saúde (SUS) para o ao que não estiver no rol de procedimentos da ANS.

De certo modo, a própria autonomia e dever do médico, a quem compete a prescrição do tratamento mais adequado ao paciente, e a utilização de todos os meios de promoção de saúde e de prevenção, diagnóstico e tratamento de doenças, será relativizada, tendo em vista que a taxatividade afasta o dever do plano de cobrir itens fora da lista. Para a ministra Nancy Andrighi, a evolução da medicina não pode ser tida como fator limitante das obrigações das operadoras.

Por isso, com a retomada do julgamento, espera-se que prevaleça o entendimento da ministra Nancy Andrighi, porquanto negar a natureza meramente exemplificativa do rol de procedimentos da ANS agrava a condição de vulnerabilidade do consumidor e atesta a exorbitância do poder normativo e, de outro lado, reconhecê-la, viabiliza a concretização da política de saúde e a harmonia e equilíbrio das relações.

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