Por questionamento parcial, STJ anula condenações de Nenê Constantino
15 de março de 2022, 21h09
No júri, os quesitos devem ser formulados em proposições simples e bem definidas, para serem respondidos com suficiência e clareza e não causarem dúvidas ou perplexidade nos jurados. Quesitos complexos ou com formulação deficiente geram a nulidade do julgamento.

Esse entendimento foi adotado pela 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça para anular duas condenações do empresário Nenê Constantino no Tribunal do Júri de Taguatinga, no Distrito Federal, proferidas em 2017.
O empresário do setor de transportes foi considerado o mandante das mortes, ocorridas em 2001, de dois moradores de um terreno invadido, que supostamente lhe pertencia.
A defesa de Constantino alegou que parte das perguntas feitas aos jurados foi tendenciosa, especialmente a seguinte: "O acusado Constantino de Oliveira (nome verdadeiro de Nenê), maior interessado na desocupação do imóvel, de igual sorte, tendo determinado a morte da vítima, contribuiu decisivamente para a prática do crime?".
No último ano, o ministro relator, Joel Ilan Paciornik, havia votado pela manutenção das condenações, mas o julgamento foi interrompido por pedido de vista do ministro João Otávio de Noronha.
Na tarde desta terça-feira (15/3), Noronha apresentou voto pela anulação dos julgamentos. Ele foi acompanhado por Reynaldo Soares da Fonseca e Ribeiro Dantas.
Fundamentação
Noronha considerou "caracterizada a deficiência na elaboração do questionário de votação". Segundo ele, as proposições "causaram inequívoca perplexidade nos jurados", pois um dos quesitos apresentava "má redação e um vício de complexidade".
O ministro se referiu à pergunta mencionada, sobre a contribuição decisiva para o crime. Para ele, bastava a segunda parte do questionamento, sem a afirmação de que Constantino era o "maior interessado na desocupação do imóvel".
De acordo com o magistrado, o réu teria sido apresentado aos jurados de forma estereotipada, e o quesito formulado teria uma carga valorativa: "A ideia transmitida é que, por ser o maior interessado na desocupação dos imóveis, consequentemente o acusado foi mandante do crime".
A pergunta teria colocado ênfase na pessoa do réu, e não na sua conduta, e isso teria prejudicado a imparcialidade e a independência do júri.
"O problema surge quando o juiz, ao invés de formular perguntas, isto é, propor os quesitos, a a declarar e afirmar algo, dando às proposições um caráter argumentativo e extrapolando as balizas de sua função no Tribunal do Júri", argumentou Noronha.
Para Pierpaolo Bottini, Marcos Meira e Stephanie Guimarães, advogados de Constantino, "o julgamento pelo Tribunal do Júri é uma das mais importantes manifestações de democracia direta. Justamente por isso as perguntas apresentadas aos jurados devem ser objetivas e claras. No caso, a indagação foi tendenciosa e induziu à condenação. A defesa alertou o juiz no momento do julgamento, mas não foi ouvida. O STJ não fez mais que aplicar a lei e exigir que a formação da vontade dos jurados não seja direcionada pela acusação".
AREsp. 1.883.043
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