Opinião

A Parada do Orgulho LGBT como um direito cultural

Autores

  • é advogado professor mestre em ensino e formação docente membro do Grupo de Estudos e Pesquisas em Direitos Culturais da Universidade de Fortaleza capoeirista secretário executivo do Instituto Brasileiro de Direitos Culturais (IBDCult) e membro da Comissão de Direitos Culturais da OAB-CE.

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  • é advogada especialista em Direito e Processo do Trabalho LLM pela FGV em Direito Empresarial membro da Comissão da Diversidade Sexual e de Gênero da OAB Ceará.

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  • é podcaster advogada especialista em Direito Penal Processo Penal e Direito de Família e Sucessões mestranda em Direito Constitucional pela Unifor membro da Comissão da Diversidade e de Gênero da OAB Ceará autora do livro Política de drogas no Brasil e novas abordagens: Recurso Extraordinário n° 635.659 e Projeto de Lei n° 7.187/2014.

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5 de setembro de 2022, 18h49

A 21ª Parada do Orgulho LGBT de Fortaleza aconteceu no último dia 7 de agosto. O evento contou com a participação de diversas entidades, entre elas a Ordem dos Advogados do Brasil — Seção Ceará (OAB-CE), por meio da Comissão da Diversidade Sexual e de Gênero, o que nos faz refletir sobre o exercício da cidadania e a efetivação de direitos, entre eles, os direitos culturais.

Rovena Rosa/Agência Brasil
Rovena Rosa/Agência Brasil

A Constituição Federal de 1988 ampliou o conceito de cultura, albergando o patrimônio material e imaterial, incluindo populações minoritárias, a exemplo das populações negras e os povos originários. Nesse contexto, foi possível inserir as populações LGBTQIAPN+ [1], tendo em vista, que o princípio da universalidade, inferido do texto constitucional, garante a todos, todas e todes o pleno exercício dos direitos culturais, e o princípio do pluralismo cultural, propõe o apoio às manifestações culturais dos diversos grupos, sem privilégios e a eleição de uma cultura oficial.

A Parada do Orgulho tem a sua gênese em um evento norte-americano. Em 28 de junho de 1969, surgiu um movimento de resistência no bar Stonewall Inn, em Nova York [2], contra a ação agressiva de policiais à comunidade gay. Um ano após o incidente, ocorreu a primeira grande Parada do Orgulho Gay. Esse movimento ganhou um valor simbólico que impulsionou a luta por direitos LGBTQIAPN+ no mundo, e essa data ou, então, a ser considerada o Dia Internacional do Orgulho LGBT+.

No Brasil, uma aproximação importante entre os militantes LGBTs e o Estado aconteceu por meio do Ministério da Saúde nos anos 1980 com as políticas de enfrentamento ao HIV/AIDS. Nesse período, embora ainda numa perspectiva higienista e de controle de corpos, espaços políticos contra a LGBTfobia foram constituídos e as discussões ampliadas para os níveis estadual e municipal, avançando na década de 90.

A primeira Parada do Orgulho só aconteceu no Brasil em 1997 [3], na Avenida Paulista, em São Paulo. Atualmente é considerada a maior do mundo e uma das mais famosas, registrando a sua 26ª edição neste ano. As Paradas do Orgulho LGBT foram apoiadas pela área da saúde que também fazia uma forte campanha para a contenção do vírus HIV/AIDS.

Nos anos 2000, um conjunto de programas, ações e mecanismos institucionais do Ministério da Cultura (MinC), contemplou a população LGBTQIAPN+, oferecendo um e logístico no âmbito cultural. A criação de um grupo de trabalho para a promoção da cidadania dessa comunidade, ligado à Secretaria de Identidade e Diversidade Cultural (SID) do MinC, institucionalizou as agendas culturais do movimento por meio de uma política cultural em âmbito federal.

Apoiar as Paradas Gay ou a ser uma prioridade, pois se tratava de um evento de grande visibilidade, afirmação do direito à expressão de orientação sexual, identidade e expressão de gênero, exercício da cidadania e uma cultura de paz. Dessa forma, o MinC publicou, em 2005, o primeiro edital para a Parada do Orgulho [4], direcionando uma ação específica para essa comunidade. A reestruturação ocorrida na gestão de Gilberto Gil (2003-2008) proporcionou a divisão de espaço e recursos entre as áreas clássicas das políticas culturais com áreas emergentes, tais como a cultura alimentar, as culturas populares, entre outras, inclusive a cultura LGBT.

A inclusão das produções das populações LGBTQIAPN+ fortaleceu um discurso calcado na diversidade que rompe com tradições que afogam a subjetividade e os sentidos afetivos, sexuais e sociais estigmatizados no processo histórico.

Assim, as vivências que tematizam as sexualidades dissidentes, tais como shows de drag queen, expressões teatrais, de dança, artes visuais, entre outras, aram a ser compreendidas como produção simbólica, incluindo as Paradas do Orgulho, que oferecem visibilidade em um ato político-social que grita e afirma a existência que precisa ser vista, com voz e direitos efetivados.

No contexto dessas produções culturais, memória e visibilidade precisam ser lembradas em alusão as personagens que lutaram para tornar a população LGBTQIAPN+ visível e com o sentimento de pertencimento.

Além do apoio para a realização da Parada do Orgulho, é urgente o mapeamento cultural da comunidade, para que políticas mais incisivas sejam encetadas no fito de garantir a existência com dignidade, na qual esses sujeitos históricos possam exercer o direito de criar, difundir e fruir as produções culturais, com base no tripé artes, memória coletiva e fluxo de saberes.


Notas :

[1] LGBTQIAPN+ é uma sigla que abrange pessoas que são Lésbicas, Gays, Bi, Trans, Queer/Questionando, Intersexo, Assexuais/Arromânticas/Agênero, Pan/Poli, Não-binárias e mais

[2] https://www.nationalgeographicbrasil.com/cultura/2021/06/gay-lgbt-revolta-de-stonewall-movimento-atual-pelos-direitos-lgbtqia

[3] http://memorialdademocracia.com.br/card/sp-faz-sua-1a-parada-do-orgulho-gay

Referências
CUNHA FILHO, Francisco Humberto. Teoria dos Direitos Culturais: fundamentos e finalidades. São Paulo: Edições SESC SP, 2018.

MUNIZ JR., José de Souza; BARBALHO, Alexandre Almeida. Entre a Diversidade e o Antagonismo: Práticas articulatórias da discursividade LGBT no Ministério da Cultura. Revista Brasileira de Ciências Sociais (RBCS) – Vol. 35 n° 102. 2020.

Autores

  • é capoeirista, advogado, professor, mestre em ensino e formação docente, especialista em Direitos Homoafetivos e de Gênero, membro do Grupo de Estudos e Pesquisas em Direitos Culturais da Universidade de Fortaleza (GEPDC/Unifor), membro da Comissão da Diversidade e de Gênero da OAB Ceará e secretário executivo do Instituto Brasileiro de Direitos Culturais (IBDCult).

  • é advogada, especialista em Direito e Processo do Trabalho, LLM pela FGV em Direito Empresarial, membro da Comissão da Diversidade Sexual e de Gênero da OAB Ceará.

  • é podcaster, advogada, especialista em Direito Penal, Processo Penal e Direito de Família e Sucessões, mestranda em Direito Constitucional pela Unifor, membro da Comissão da Diversidade e de Gênero da OAB Ceará, autora do livro Política de drogas no Brasil e novas abordagens: Recurso Extraordinário n° 635.659 e Projeto de Lei n° 7.187/2014.

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