Desafios e perspectivas da reforma tributária
29 de novembro de 2023, 17h17
No recente cenário legislativo, a deliberação dos senadores acerca da reforma tributária, marcada por intensos debates e escrutínio, culminou na aprovação do texto-base pela Comissão de Constituição e Justiça e, consequentemente, no Senado. Esse evento legislativo representa um o decisivo na revisão da estrutura tributária da República, uma questão de inegável envergadura nacional.

Não obstante, uma análise crítica do projeto aprovado sugere que, enquanto intenta simplificar o regime tributário com a unificação de impostos, tal movimento legislativo pode suscitar questionamentos quanto à efetiva justiça fiscal e eficiência econômica.
A transição para o novo sistema de impostos sobre bens e serviços, nominados CBS e IBS, será gradual, estendendo-se até 2033, uma dilatação temporal que, embora planejada para evitar prejuízos na arrecadação dos entes federativos, pode postergar os benefícios da simplificação tributária e impactar a segurança jurídica para contribuintes e investidores.
Ademais, o projeto contempla isenções fiscais para determinados setores e bens, o que, em teoria, deveria promover equidade social; entretanto, permanece a indagação sobre se tais isenções não acarretarão uma renúncia fiscal demasiadamente onerosa.
No âmbito da crítica, é de se ponderar que a proposta elenca um conjunto de bens e serviços íveis de isenção sem uma análise aprofundada de suas repercussões econômicas. Por exemplo, a isenção de IVAs para o transporte coletivo e dispositivos médicos pode reduzir custos para o consumidor final, mas é imperioso questionar: a que custo para o erário e com que efetividade na redistribuição de renda?
Adentrando a esfera dos templos religiosos e entidades assistenciais, a imunidade tributária proposta prolonga um debate sobre a extensão da beneficência e o ônus para a sociedade civil. A argumentação prevalecente no Senado parece desconsiderar o impacto fiscal a longo prazo dessas isenções, negligenciando uma discussão mais robusta sobre a contribuição dessas entidades para a coletividade em contrapartida aos benefícios fiscais recebidos.
A introdução do Imposto Seletivo, ou o “Imposto do pecado”, é outro vetor de controvérsia. A medida pretende desincentivar o consumo de produtos nocivos à saúde e ao meio ambiente, mas a sua implementação suscita inquietações acerca da eficácia regulatória e da potencial regressividade, afetando desproporcionalmente as camadas menos abastadas da população, que tradicionalmente consomem tais produtos.
Quanto à tributação da renda e do patrimônio, a proposta aponta para uma progressividade fiscal em bens de luxo e heranças. Embora essa medida seja um avanço potencial na equidade tributária, o desafio reside na operacionalização efetiva e na prevenção de elisão fiscal, especialmente em contextos transnacionais.
A necessidade de um retorno à Câmara dos Deputados para apreciação das modificações introduzidas pelos senadores adiciona outra camada de complexidade ao processo legislativo. O processo de votação, permeado por controvérsias e negociações, refletiu o caráter complexo da matéria, evidenciando divergências intrínsecas entre as perspectivas econômicas e sociais dos diversos representantes da federação. As dissensões mais acentuadas emergiram em torno de temas como a definição das alíquotas dos novos impostos, a desoneração de produtos essenciais e a distribuição equitativa de receitas tributárias.
Os pontos nevrálgicos que polarizaram as opiniões foram, primordialmente, a implementação do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). A discussão centrou-se na adequação das alíquotas para assegurar a neutralidade fiscal sem prejudicar a capacidade de arrecadação dos entes federativos e, concomitantemente, sem aumentar a carga tributária sobre o cidadão.
A criação de um Fundo de Desenvolvimento Regional suscitou um intenso debate, especialmente sobre os critérios de distribuição dos recursos. Representantes das regiões Norte e Nordeste defenderam veementemente um modelo de distribuição que favorecesse os estados com menor Produto Interno Bruto (PIB) per capita, visando a uma política de redistribuição que fomente o equilíbrio regional.
A proposta de estabelecimento de regimes tributários especiais para determinados setores da economia também foi objeto de controvérsia, com argumentos versando sobre o risco de tais regimes resultarem em distorções competitivas e impactarem negativamente a uniformidade do sistema tributário nacional.
A inclusão da Zona Franca de Manaus no texto é outro ponto que gerou polêmica, com a proposição de um Fundo de Sustentabilidade e Diversificação Econômica para o Amazonas sendo vista por alguns como uma concessão excessiva, enquanto outros a defendiam como essencial para a manutenção da competitividade da região.
Com a aprovação, as expectativas para a tramitação da reforma no Congresso Nacional são de um caminho ainda repleto de negociações. A complexidade das matérias tributárias e a necessidade de conciliar interesses diversos entre os membros da casa legislativa sugerem que a proposição sofrerá emendas e ajustes antes de alcançar sua forma final.
A possibilidade de o Brasil vir a possuir uma das alíquotas de impostos mais elevadas do mundo é uma inquietação que permeia a discussão da reforma tributária. Tal perspectiva aviva o temor de que o novo sistema tributário, apesar de pretender simplificar a cobrança e istração dos tributos, possa resultar num incremento desproporcional da carga fiscal, afetando a competitividade empresarial e onerando o cidadão comum.
É inegável que a alta carga tributária tem implicações diretas na dinâmica econômica, podendo desestimular investimentos e restringir o crescimento. Uma linha crítica sustenta que a elevação das alíquotas, sem uma correspondente melhoria na qualidade dos serviços públicos e na eficiência da gestão fiscal, traduz-se em um descomo entre a tributação e os benefícios tangíveis à população. A reforma tributária, portanto, deve ser cautelosa para não agravar este cenário.
Sendo assim, a votação da reforma tributária no Senado foi apenas o início de um percurso legislativo mais extenso e detalhado. As perspectivas para a tramitação subsequente da proposta legislativa no Congresso são de um processo meticuloso e deliberativo, exigindo um alto grau de diálogo interpartidário e intergovernamental para que se alcance um consenso que reflita as necessidades e as expectativas da sociedade brasileira quanto a um sistema tributário mais justo, eficiente e equitativo.
O ideal de uma reforma tributária, que concilie simplificação, eficiência e justiça fiscal, não deve ser ofuscado por interesses setoriais ou pela pressa em se obter resultados imediatos. A prudência e a visão de longo prazo devem nortear as deliberações, assegurando que os benefícios proclamados se concretizem de maneira sustentável e inclusiva.
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