Fabricantes podem responder por adulteração de componentes certificados
11 de outubro de 2023, 9h19
A Portaria nº 20/2017, do Inmetro, que ou a ser compulsória desde 17/08/2019, determinou que as luminárias para a iluminação pública viária fabricadas, importadas, distribuídas ou comercializadas em território nacional, devem ser submetidas, compulsoriamente, à avaliação da conformidade, por meio do mecanismo de certificação, sendo revogada e substituída pela Portaria nº 62/2022, pelo mesmo órgão, que aprovou o regulamento técnico da qualidade e os requisitos de avaliação da conformidade para luminárias para iluminação pública viária, assim como o conceito de família de luminárias com tecnologia LED (item 4.1) e com lâmpadas de descarga (item 4.2).
Com efeito, foi fixado na referida regulamentação que após a certificação, as luminárias para a iluminação pública viária, devem ser registradas no Inmetro, levando em consideração as condições previstas na Portaria n° 258/2020, que confere a validade do certificado até dois anos a partir da emissão da declaração de selagem, bem como que a perda da validade do certificado ocorre nos casos em que sejam realizadas modificações que possam influenciar as características metrológicas do instrumento (artigo 15).

Assim, a obtenção do registro é condicionante para a autorização do uso do Selo de Identificação da conformidade nos produtos certificados e para sua disponibilização no mercado nacional, ando o fabricante, importador ou a ele equiparado, obrigado a comercializar somente seus produtos com todos os componentes que foram efetivamente analisados pela certificadora e registrados no Inmetro, não sendo possível realizar qualquer alteração qualitativa ou quantitativa sem que seja submetido novamente ao crivo do Organismo de Certificação do Produto (O), bem como a ocorrência de um novo registro, nos termos da Solução de consulto Inmetro n° 7416/2021.
Importante destacar que conforme previsão na Portaria nº 62/2022, a avaliação de manutenção do registro a pela auditoria inicial do sistema de gestão da qualidade e avaliação do processo produtivo seguindo as condições descritas no Requisitos Gerais de Certificação do Produto (RG), atendendo sempre ao plano de ensaios de manutenção que devem ser concluídos uma vez a cada período de 12 meses, contados a partir da data de emissão do Certificado. Além disso, os ensaios de manutenção devem ser realizados sempre que houver fatos que recomendem a sua realização antes deste período, como eventuais denúncias de irregularidades identificadas nas luminárias, quer seja pelo poder público ou pelo particular, em razão da adulteração de componentes com evidente divergência dos que foram avaliados e certificados para efeitos de concessão do registro.
Nesse sentido, a Portaria do Inmetro nº 200/2021, que que aprovou os Requisitos Gerais de Certificação de Produtos, estabelece no item 6.3.2., o plano de ensaios de manutenção da certificação, onde fixou que o O deve exigir que nos novos relatórios de ensaios, os laboratórios informem as incertezas de medição praticadas. Por sua vez, o item 6.4, da mesma portaria, no tópico que trata da avaliação da recertificação, determina que a coleta para realização dos ensaios deve ser realizada pelo O em amostras que tenham sido fabricadas entre a data da última manutenção e a data da recertificação, em que pese a aplicação do conceito de família de produtos também.
Conforme se verifica, não é dado margem ao fabricante para preparar uma nova amostra, vez que o O deve exigir as luminárias que foram fabricadas entre a data do último registro até a nova reavaliação, podendo inclusive solicitar que essas luminárias sejam coletadas no consumidor final, desde que os equipamentos estejam em seu estoque, ou comprovadamente que algum representante do O colete diretamente a luminária na linha de produção do fabricante, impedindo a prática adotada por algumas empresas de montagem das luminárias consideradas “golden sample” (amostra dourada), que são aquelas produzidas para atender somente os critérios da Portaria nº 62/2022 do Inmetro, no momento da avaliação inicial e reavaliação periódica, sendo distintas daquelas que posteriormente são fornecidas, com os componentes adulterados após o processo de aprovação para efeitos de comercialização no mercado nacional.
Vale ressaltar que, esse procedimento é obrigatório, inclusive gerando responsabilidade civil e criminal contra o O, caso não seja observado, vez que conforme decisão nos autos processo nº 2212533-70.2023.8.26.0000 emitida pelo desembargador Joel Birello Mandelli, da 6º Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP), “A troca de luminárias é serviço público essencial a comunidade, inclusive inerente a segurança pública. Destarte, a possiblidade de paralisação do fornecimento dos serviços públicos essenciais é um risco cuja prevenção se sobrepõe à pretensão da agravante, em decorrência da supremacia do interesse público sobre o privado”.
Diante da concorrência desleal, e com fortes indícios de cometimento de crimes, como, a falsidade ideológica, entre outros previstos no Código Penal, e na Lei de Licitações, há casos em que empresas participam de licitações declarando que atendem todos os requisitos de especificações do instrumento convocatório sob uma premissa que as luminárias atendem os requisitos da Portaria nº 62/2022 do Inmetro.
Isso ocorre, após obterem o registro no Inmetro, com base em amostras preparadas para aprovação, ando a fornecer luminárias com adulteração dos componentes, ou seja, componentes diferentes daqueles previstos no projeto do produto, o que pode levar a falhas de funcionamento ou alteração do desempenho geral da luminária, níveis de eficiência energética divergentes das amostras certificadas, com comprometimento da vida útil do equipamento, da qualidade do serviço de iluminação ou da segurança intrínseca do produto, o que levaria ao contato acidental pelo usuário ou instalador com as partes vivas do equipamento ou da sua estrutura de instalação. Com isso, não atendendo os requisitos mínimos de qualidade, eficiência e segurança, pode-se expor o cidadão usuário ou os instaladores a riscos, lesando os cofres públicos por aquisição de luminárias com componentes adulterados que descumprem a portaria do Inmetro.
Entre as irregularidades e/ou ilegalidades praticadas contra os consumidores, destacamos algumas que se revelam gravíssimas a saber: declaração de grau de proteção diferente do ensaiado por laboratório; modificação do driver com limitação da variação de corrente, divergente ao modelo submetido a certificação; declaração de potência total nominal inferior ao valor real consumido pela luminária e/ou fluxo luminoso total emitido em valores superiores ao medidos em laboratórios, objetivando com isso um aumento na eficácia luminosa em lm/W, visando ostentar em seus catálogos alto grau de eficiência de forma fraudulenta e simulada, colocando a istração pública adquirente do produto em risco econômico, pois as distribuidoras de energia podem cobrar valores retroativos, nos termos do §2º, do inciso II do artigo 324, da Resolução nº 1.000/2021 da Aneel, por força da declaração de consumo falsa em valor menor.
Outro ponto de observação após a obtenção do registro no Inmetro, é a comercialização dessas luminárias que são adquiridas pelo poder público municipal. Trata-se da constatação da redução dolosa e planejada da quantidade de leds que compõem a parte difusora de luz nas luminárias (corpo ótico), o que demonstra, no caso de uma redução do desempenho do produto, a intenção do fabricante e/ou importador/distribuidor de lesar o consumidor final com o fornecimento de material de baixa qualidade ou diferente do projeto do produto.
A materialidade dos crimes praticados narrados anteriormente ainda é maior, quando se avalia as questões de cobertura de garantia do produto negada pelo fornecedor/fabricante da luminária por ocasião da queima do equipamento por oscilação da rede de distribuição de energia em picos de sobretensão ou uma subtensão, e se descobre que o fabricante retirou o dispositivo que previne este tipo de comportamento da rede. Neste caso, o DPS — dispositivo de proteção contra surtos, fixado pela IEC 61000-4-5 e pela IEEE C.62.41-2002, com requisitos técnicos relacionado a imunidade contra surtos para luminárias LED visa garantir a integralidade das luminárias instaladas em campo e sujeita às intempéries, e com essas adulterações conseguem apresentar propostas com deságios que chegam em alguns casos a mais de 60% do valor estimado nas licitações com o poder público.
A respeito do tema, importante destacar que a Prefeitura Municipal de Castro (PR), deflagrou processo licitatório na modalidade Pregão Eletrônico nº 62/2023 – Registro de Preços para aquisição de luminárias públicas em LED. A municipalidade, por não possuir pessoas capacitadas para verificar as condições técnicas do produto, contratou uma empresa de engenharia especializada que encaminhou as amostras do fabricante das luminárias — cumprindo a exigência do edital — a um dos laboratórios acreditados pelo Inmetro e de grande fé pública (o Labelo — Laboratórios Especializados em Eletroeletrônica, Calibração e Ensaios e vinculado a PUC-RS), que após análise e avaliação do parecer da empresa independente concluiu que: 1) as amostras não são idênticas aos produtos enviados pelo fornecedor para ensaio quando da homologação junto ao Inmetro; 2) o produto ofertado pelo referido fabricante não atende as exigências editalícias (em especial no que tange o atendimento a portaria 62/2022 do Inmetro; 3) no brasil é proibida a comercialização de luminárias LED para fins de iluminação pública que não atendam a portaria 62/2022 do Inmetro, entendendo assim do ponto de vista técnico que a fabricante de luminárias fosse desclassificada.
A fabricante ainda ofereceu recurso istrativo com apresentação de novas amostras resultando em um novo parecer com as seguintes razões: “Por fim entendo que: Tanto as amostras apresentadas para a primeira análise quanto para segunda análise não são certificadas pelo Inmetro pois tiveram suas características alteradas em relação as originalmente certificadas.”
Vale lembrar, que o fabricante e/ou importador do produto ao obter a certificação e registro perante o Inmetro, e promove adulterações dos componentes certificados, responde civil e criminalmente caso sejam comprovada as divergências, em especial se os valores medidos em ensaios para verificação da potência total nominal, com os procedimentos prescritos pela portaria pertinente, não sejam iguais aos valores nominais declarados nos catálogos ou em documentos, ou seja, valores de referência para a realização dos ensaios para certificação e registro do produto, sendo os mesmos produtos e/ou família de luminárias que foram certificados e registrados pelo Inmetro, nos termos da Portaria nº 62/2022, que alterou a Portaria nº 20/2017 do Inmetro, respondendo solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade, bem como por aqueles decorrentes da disparidade.
Não obstante ao exposto, os fabricantes ou importadores de luminárias, estão sujeitos, em todo o território nacional, às ações de vigilância de mercado executadas pelo Inmetro e entidades de direito público a ele vinculadas por convênio de delegação, nesse caso o Instituto de Pesos e Medidas (Ipem), ou seja, havendo qualquer indício de irregularidade ou ilegalidade constatada por agente público responsável pela gestão, controle e fiscalização de contrato de concessão do serviço de iluminação pública ou particular que identificar adulterações de componentes dessas luminárias que inicialmente aram pelo Organismo de Certificação do Produto (O), devem instaurar e/ou requerer abertura de processo istrativo próprio, sob pena de não o fazer responder pelo crime de omissão funcional, com a finalidade de apuração do incidente de falsidade documental e não cumprimento das especificações previstas na portaria, concedendo prazo para o contraditório e submetendo as luminárias para realização de ensaios em laboratório de terceira parte, devidamente acreditado pelo Inmetro garantindo com isso a imparcialidade no exame do desempenho dos equipamentos e comprovação ou não do atendimento a Portaria nº 62/2022 Inmetro.
Nesse particular, havendo confirmação de que a luminária após ensaiada não atendeu os requisitos da portaria o fornecedor do produto que participou da licitação direta ou indiretamente ou comercializou a luminária ao particular, assumiu para si, o risco que essa opção poderá causar — lesão ao erário ou risco à segurança da população — concorrendo de alguma forma para o evento doloso.
Não é demais lembrar que é vedado ao fornecedor de produtos e serviços colocar no mercado de consumo, qualquer produto em desacordo com as normas, em especial a ABNT e Portaria do Inmetro, consoante previsão do inciso VIII do artigo 39 da Lei nº 8.078/90. Nesse o, a nova lei de licitações — Lei nº 14.133/2021 —, visando evitar o canibalismos de preços, trouxe dispositivos que ligam as licitações aos requisitos de conformidade de produtos, estabelecidos em normas técnicas, exigindo inclusive a comprovação de que o produto está de acordo com as normas determinadas pelos órgãos oficiais competentes, pela ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas), ou por outra entidade credenciada pelo Inmetro ou até determinar a exibição laudo laboratorial ou documento similar que possibilite a aferição da qualidade e da conformidade do produto ou do processo de fabricação, nos termos do inciso I, II, III e do artigo 42, da referida lei.
Importante destacar o fabricante está obrigado a indicar um engenheiro responsável pelo projeto e fabricação do produto, a fim de obter o registro da empresa junto ao Crea, nos termos da Lei 5.194/66 artigo 7°, 59, 60, 61 e 62 e Resoluções n° 336/89 e 417/98 do Confea. Assim, por força da legislação vigente, comprovada a adulteração dos componentes certificados, o engenheiro responsável pela empresa fabricante de luminárias poderá responder civil e criminalmente, bem como ser representado perante sua entidade de classe, visando responder processo disciplinar pela omissão referente as adulterações de componentes certificados e registrados no Inmetro, concorrendo o profissional culposamente com o evento danoso e lesivo ao consumidor.
Assim, a participação em licitações com apresentação declaração de atendimento a todos os requisitos de habilitação do edital, com posterior desclassificação do licitante pelo não atendimento, em especial pelos indícios de fraude e adulteração de componentes certificados, obriga o agente público, nos exatos termos do artigo 40 do Código de Processo Penal, remeter os autos do procedimento istrativo ao Ministério Público, visando a instauração de investigação criminal, vez que a prestação de declaração falsa para fraudar o caráter competitivo da licitação está previsto no tipo penal da Lei de Licitações, ainda caracterizando o tipo penal do crime de falsificação de documento público, capitulado no artigo 297 a 304 do Código Penal.
Com efeito, o Ministério Público quando do recebimento da notícia de fato, poderá apurar a ocorrência de fraude em licitação, e violação da alínea “b” do inciso IV do artigo 5º da Lei nº 12.846/2013, que trata da responsabilização istrativa e civil das pessoas jurídicas pela prática de atos contra istração Pública.
Caberá, ainda, a empresa ser declarada inidônea em processo próprio, pelo órgão da istração Municipal com suspensão de participar de licitações pelo prazo de dois anos, encaminhando-se os autos ao Inmetro para abertura de processo istrativo e aplicação de sanções previstas na Lei n° 9.933/1999, combinado com a Portaria nº 258/2020, inclusive com o cancelamento do registro do fabricante, sem prejuízo de eventual ajuizamento de ação civil pública pleiteando dano moral coletivo com objetivo de evitar nova práticas semelhantes (punitive damages) contra os consumidores que podem chegar a R$ 10 milhões, vez que tal conduta praticada por determinados fabricantes ou importadores apresenta elevada reprovabilidade, portanto, deve ser repreendida em patamar capaz de desestimular idênticos ou assemelhados procedimentos, fixando-se a reparação dos danos morais coletivos em atenção ao hoje já pacificado caráter educativo punitivo do dano moral.
Outro lado (nota da Redação)
Em complemento ao artigo, em especial à informação de que a fabricante (Tradetek) que havia vencido processo licitatório em Castro não teve suas amostras aprovadas após recurso istrativo, é importante consignar que, conforme memorando específico da Prefeitura de Castro (499/2023), a Tradetek teve, sim, seus produtos aprovados por análise técnica levada a efeito por laboratório especializado da Universidade Federal Fluminense.
O processo licitatório deflagrado pela municipalidade acima referida apenas não teve sucesso, ainda com base no memorando nº 499/2023, exclusivamente por força de transtornos e tumultos criados por algumas pessoas e empresas, e não em razão de inconformidade das amostras oferecidas pela primeira colocada no certame.
Clique aqui para ler o memorando da Prefeitura de Castro (PR)
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