Complementação de preparo recursal nos JECs é essencial para a Justiça
25 de outubro de 2023, 15h17
A luta dos advogados para obter decisões que permitam a complementação do recolhimento de custas em recursos dos juizados especiais, sem que isso resulte em deserção, é uma batalha fundamental no campo jurídico. Essa questão não apenas impacta diretamente a capacidade de o à justiça de muitos cidadãos, mas também é essencial para garantir que o sistema legal seja justo e equitativo.
A Lei dos Juizados Especiais (Lei nº 9.099/95) estabelece procedimentos simplificados e desburocratizados para lidar com causas de menor complexidade e valor. Uma das características mais marcantes desses Juizados é o objetivo de tornar possível o o à justiça. No entanto, em alguns casos o recolhimento de custas pode ser feito a menor, seja por erro de cálculo, erro do sistema ou simplesmente por um erro material. Quando as custas são recolhidas de forma inadequada, o risco de deserção se torna uma preocupação iminente. A deserção é a penalidade que pode ser aplicada quando as custas não são pagas ou são recolhidas incorretamente. Ela pode resultar na não modificação da sentença que se queria ver reanalisada.

A busca por decisões que permitam a complementação de custas sem gerar deserção tem se baseado não apenas na interpretação estrita da lei, mas também na busca pela equidade e no respeito ao princípio do o à justiça. Muitos advogados argumentam que a deserção não deve ser aplicada de forma automática, especialmente quando a parte demonstra que está disposta a cumprir com as obrigações financeiras pendentes conforme dito acima. Essa luta não é apenas sobre o interesse dos advogados, mas principalmente sobre garantir que o sistema legal seja ível e justo para todos. Garantir que as custas recolhidas incorretamente não se tornem uma barreira intransponível para o o à justiça é um objetivo fundamental no campo jurídico. É uma questão de equidade, responsabilidade e respeito aos princípios que norteiam a justiça.
Como uma luz no final desse sombrio túnel, dias atrás a Turma de Uniformização do TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) reacendeu a esperança dos advogados que militam nos juizados especiais e enfrentam rotineiramente a injustiça de terem seus recursos julgados desertos.
A turma fixou a seguinte tese a respeito das custas:
"Preparo recursal no âmbito dos juizados especiais – não recolhimento ou recolhimento insuficiente – possibilidade de aplicação subsidiária do artigo 1.007 e parágrafos do código de processo civil – revisão puil número 0000043-07.2017.8.26.9001."
Isso é uma vitória para os advogados, sem precedente.
Esse o da magistratura paulista coloca novamente em debate a injustiça das custas judiciais no preparo dos recursos inominados. Caso seja firmada a tese proposta, entendemos que é o caso da revogação imediata do Enunciado 80 do Fonaje (Forum Nacional de Juizados Especiais), que não abre espaço para complementação de eventual divergência no recolhimento das custas. A saber:
Enunciado Cível nº 80 do Fonaje:
"O recurso Inominado será julgado deserto quando não houver o recolhimento integral do preparo e sua respectiva comprovação pela parte, no prazo de 48 horas, não itida a complementação intempestiva (artigo 42, §1º, da Lei 9.099/1995) (nova redação — XII Encontro Maceió-AL)."
Essa proposta leva à tona a nova dinâmica na dualidade entre o o facilitado ao Judiciário, as inovações tecnológicas advindas com a pandemia, mas também coloca sob tensão a relação entre os princípios que regem os JECs e o que se entrega efetivamente ao jurisdicionado em termos práticos.
O que se observa nesse enunciado em sua dialética simples, revestido do cunho célere, não só dificulta, retarda e mitiga o bom direito, como impede o o à justiça de forma fria e descompromissada, conforme já mencionado. Ao se afirmar isso, não se está fazendo referência aos magistrados que têm o dever de aplicar as ferramentas que dispõem, a Lei ou Enunciados e normas pertinentes, mas ao sistema — que precisa de ajustes imediatamente.
No 50º Fonaje defendeu-se a revogação da parte final do dito enunciado, conforme proposto no artigo "A injustiça das custas nos Juizados Especiais", de autoria dos advogados Ricardo da Costa Alves e Murilo da Silva Ferreira. Esta foi a nova redação sugerida:
"O recurso Inominado será julgado deserto quando não houver o recolhimento integral do preparo e sua respectiva comprovação pela parte, no prazo de 48 horas, aplicando-se subsidiariamente o artigo 1.007 e parágrafos do Código de processo civil."
A proposta foi sustentada seguindo os princípios que regem a Lei 9.099/95 e também pelo fato de que sendo os juizados um microssistema simplificado, é a porta de entrada para muitos advogados recém-formados ao mercado de trabalho. Neste rito, os advogados novatos encontram enorme dificuldade com o preenchimento da guia de recolhimento, em especial a do Tribunal fluminense, trazendo uma tecnicidade incompatível com a simplicidade dos próprios JECs. Mas não só se aplica às principais capitais como Rio de Janeiro e São Paulo. Faz-se necessária uma imediata mudança em todo o território nacional.
A proposta foi por maioria rejeitada, sob o argumento de que este Enunciado não poderia ser alterado para acomodar um problema setorizado nos Tribunais fluminense e paulista e que afetaria outros Estados que possuem sistemas mais modernos, robôs e sistema automático de preenchimento de guias disponibilizados pelos próprios Tribunais. Entretanto, a situação descrita reflete um desafio comum em processos de tomada de decisão, onde a necessidade de equilibrar interesses e realidades diferentes é evidente. A rejeição da proposta de alteração do Enunciado, sob o argumento de que tal mudança poderia prejudicar Estados com sistemas mais modernos, por si só revela a complexidade de questões envolvendo sistemas judiciais e regulatórios.
Em um cenário ideal, a busca por soluções deve levar em consideração a diversidade de realidades e necessidades dos diferentes Estados e tribunais. É compreensível que, em alguns casos, a alteração de um enunciado ou regulamento específico possa criar conflitos ou implicações não intencionais em outras regiões. Nesse sentido, a preocupação com a uniformidade e a harmonização das regras e procedimentos judiciais em todo o país é legítima.
A possibilidade da tese firmada pelo colegiado paulista nos abre um leque de possibilidades de reacender um debate maduro e isento, de soluções eficientes para frear o alto volume de recursos desertos nas turmas recursais. Uma delas, e que foi ponto de debate no 50º Fonaje, seria a possibilidade de no próprio site do Tribunal de Justiça a guia já sair impressa com o valor correto a ser pago. Outra solução seria a certificação prévia, pela serventia do Juizado, do valor a ser recolhido para o recurso.
A aplicação subsidiária do C pode ser uma alternativa para resolver essa questão: o artigo 1.007 e seus parágrafos tratam do preparo de recursos e estabelecem regras claras sobre a regularização do preparo, incluindo prazos para pagamento das custas de forma suplementar.
A aplicação subsidiária desses dispositivos do C nos juizados especiais pode ser vista como uma tentativa de harmonizar a simplicidade e o o à justiça com a necessidade de manter a eficiência e a ordem no processo. Essa abordagem permitiria às partes regularizarem o recolhimento do preparo, evitando a deserção, desde que sigam as normas estabelecidas pelo C ou outra que se entendesse mais adequada ao rito escolhido.
Por óbvio, essas sugestões se tornam apenas complementares e provavelmente inócuas, caso a tese definida persista, o que aliviaria e traria muito mais justiça aos jurisdicionados. Com essa decisão, teríamos o ajuste do procedimento que rege a própria Lei no que se refere à simplicidade; teríamos substancial economia processual não só dentro do próprio processo, mas também impedindo a propositura de mandados de segurança e agravos (nos tribunais onde é permitida a interposição deste recurso em sede de juizado); e, por fim, evitaríamos a propositura de novas demandas rediscutindo sob novo viés e muitas vezes com narrativa similar, demanda anteriormente mitigada pela injustiça que sobrepõe a decretação de deserção de um recurso inominado.
A busca pela justiça e pela facilitação do o à justiça deve ser o cerne de qualquer mudança no sistema judiciário. É fundamental reconhecer que a realidade judiciária pode variar significativamente de um Estado para outro, e as regras e procedimentos precisam ser adaptados para refletir essas diferenças. A busca pela harmonização das regras judiciais em todo o país é louvável, mas deve ser equilibrada com a consideração das peculiaridades locais. Essa abordagem proativa e pragmática da decisão do TJ-SP pode ser um o importante na direção certa.
Encontrou um erro? Avise nossa equipe!