Distinguishing do Tema 985 do STF e a não incidência na cota empregado
1 de agosto de 2024, 19h37
Muitos sindicatos representantes das categorias dos empregados ingressaram com mandado de segurança buscando a abstenção de não serem mais compelidos ao recolhimento da contribuição social cota parte empregado, prevista nos artigos 195, II da CF, artigo 20, conjuntamente com o artigo 28, ambos da Lei nº 8.212/91, artigo 198 juntamente com o artigo 214, ambos do Decreto nº 3.048/99 pretensamente incidente sobre o terço constitucional de férias usufruídas.
Entretanto, em meados de 2017, iniciou-se a discussão sobre a natureza jurídica do terço constitucional de férias, indenizadas ou gozadas, para fins de incidência da contribuição previdenciária patronal.
Sendo o leading case o Recurso Extraordinário de nº 1.072.485, este gerou o Tema 985 do STF, o qual reconheceu a legitimidade da incidência de contribuição social sobre os valores satisfeitos a título de terço constitucional de férias.
Assim, analisando-se os pormenores do referido Tema, denota-se que explicitamente constatou que a natureza do terço de férias discutida tratou sobre a cota parte patronal, não mencionando sobre as situações que envolvem a cota parte empregado/trabalhador. Vejamos:
“Tema 985 – Natureza jurídica do terço constitucional de férias, indenizadas ou gozadas, para fins de incidência da contribuição previdenciária patronal.
Descrição: Recurso extraordinário em que se discute, à luz dos arts. 97, 103-A, 150, § 6º, 194, 195, inc. I, al. a e 201, caput e § 11, da Constituição da República, a natureza jurídica do terço constitucional de férias, indenizadas ou gozadas, para fins de incidência da contribuição previdenciária patronal.
Tese: É legítima a incidência de contribuição social sobre o valor satisfeito a título de terço constitucional de férias.”
Ressalta-se que, o Supremo Tribunal Federal declarou a incidência da contribuição previdenciária patronal sobre o terço constitucional de férias, sendo que, na ocasião, a maioria dos ministros deu parcial provimento ao RE 1.072.485, (Tema 985), interposto pela União contra decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) que considerou indevida a incidência da contribuição sobre a parcela paga pela empresa.

No entanto, muitos tribunais têm denegado a segurança dos sindicatos representante de trabalhadores utilizando do Tema 985 do STF como fator de fundamentação.
Distinções
Em que pese a semelhança de matérias, é inegável que se tratam de contribuições distintas, com fundamentos constitucionais igualmente diferentes e, especialmente, bases de cálculo que não se confundem.
A contribuição previdenciária do empregador ampara-se no artigo 195, I, “a”, da CF, que estabelece a “folha de salários e demais rendimentos do trabalho” como sua materialidade econômica.
A contribuição do empregado, por sua vez, é fundamentada no artigo 195, II, da CF, o qual não define a sua base de cálculo da exação. Pelo contrário, a Carta Magna, utilizando-se de parâmetros totalmente diversos dos previstos no inciso I, “a”, conferindo ampla liberdade ao legislador infraconstitucional para normatizar o seu campo de incidência.
Nesse sentido, enquanto a contribuição previdenciária paga pelo empregador tem como base de cálculo a “folha de salários”, conceito constitucional cuja disciplina encontra reforço na regulamentação prevista no artigo 22 da Lei nº 8.212/91, a cota do empregado tem como base de cálculo o salário-de-contribuição, definição que ficou a livre critério do legislador infraconstitucional, estando sua regência atualmente disciplina no artigo 28 da Lei 8.212/91.
Portanto, há nítida divergência entre a matéria terço de férias — cota empregado e o objeto do Tema 985, sendo que, a priori, o entendimento firmado no Tema não pode ser aplicado aos casos em que se discute a incidência da contribuição terço de férias na hipótese vertente paga pelo empregado.
Necessidade de distinguishing
De pronto, denota-se a necessidade de existência do distinguishing entre os fundamentos decididos no Tema 985 pelo STF, uma vez que, não deve prosperar a aplicação do precedente em comento nas ações apresentadas por quem discute a cota parte empregado.
Logo, não se pode aplicar precedentes que tenham por objeto a exclusão de verbas da base de cálculo da contribuição a cargo do empregador (cota patronal), cuja matriz constitucional e legal possui incidência diversa da cota empregado.
Cumprindo citar:
“TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO. ENTIDADE SINDICAL. EFICÁCIA SUBJETIVA DA SENTENÇA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. VALE-TRANSPORTE. AUXÍLIOCRECHE. VALE- ALIMENTAÇÃO IN NATURA. FALTA DE INTERESSE DE AGIR. PAGAMENTO DOS PRIMEIROS QUINZE DIAS DE AUXÍLIODOENÇA/ACIDENTE. AVISO PRÉVIO INDENIZADO. FOLGAS NÃO GOZADAS. SEGURO DE VIDA CONTRATADO PELO EMPREGADOR. AUXÍLIO NATALIDADE. SALÁRIO-MATERNIDADE. TERÇO CONSTITUCIONAL DE FÉRIAS GOZADAS COTA DOS EMPREGADOS. JUSTIÇA GRATUITA. PESSOA JURÍDICA. COMPENSAÇÃO. […]7. É ilegítima a incidência de contribuição previdenciária sobre os valores recebidos a título de terço constitucional de férias gozadas sobre a cota dos empregados, tendo em vista que não se aplica o Tema 985/STF, pois este julgou a contribuição previdenciária cota patronal.”(STJ – REsp: 2012297 RS 2022/0206314-2, relator: ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Publicação: DJ 01/08/2022)

Outrossim, outro principal fundamento que diverge para a não aplicação do Tema 985 nas relações cota empregado é que, novamente, a cota do empregado tem como base de cálculo o salário de contribuição, definição que ficou a livre critério do legislador infraconstitucional, estando sua regência atualmente disciplinada no artigo 28 da Lei 8.212/91.
Sendo pertinente ressaltar que, o § 9°, alínea “d”, do artigo 28 da Lei 8.212/91, estipula que as férias indenizadas e o adicional constitucional não integram o salário de contribuição:
“§ 9º. Não integram o salário-de-contribuição para os fins desta Lei, exclusivamente:
d) as importâncias recebidas a título de férias indenizadas e o respectivo adicional constitucional, inclusive o valor correspondente à dobra da remuneração de férias de que trata o art. 137 da Consolidação das Leis do Trabalho-CLT;”
Assim sendo, tem-se que os valores recebidos em adicional concernente às férias gozadas também não correspondem a ganhos habituais dos empregados decorrentes de prestação de serviços, motivo pelo qual a incidência das contribuições supracitadas sobre esta verba deve ser afastada.
Habitualidade e repercussão nos benefícios
Destaca-se que o artigo 201, §11 da CF, exige dois requisitos essenciais para a incorporação de ganhos aos salários, quais sejam: a) habitualidade e b) repercussão nos benefícios, de modo que somente sobre as parcelas habituais que se incorporam ao salário do empregado e que geram repercussão em benefícios é que pode haver a incidência da contribuição previdenciária, conforme literalidade ao dispositivo constitucional, em razão da própria retributividade inerente a este tipo de exação.
Assim, enquanto a contribuição previdenciária paga pelo empregador tem como base de cálculo a “folha de salários”, o conceito constitucional, cuja disciplina encontra reforço na regulamentação prevista no artigo 22 da Lei nº 8.212/91, a cota do empregado tem como base de cálculo o salário de contribuição, definição que ficou a livre critério do legislador infraconstitucional, estando sua regência atualmente disciplinada no artigo 28 da referida lei.
Portanto, não resta dúvidas de que o Tema 985 do STF não pode ser utilizado como fator de fundamentação nas discussões sobre a incidência de contribuição social da cota parte empregado sobre o terço de férias usufruídas.
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