Retrospectiva 2024

2024: o ano que o TST compreendeu a importância dos recursos repetitivos

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21 de dezembro de 2024, 9h17

A técnica de julgamento dos recursos repetitivos ingressou no ordenamento jurídico brasileiro mediante a Lei nº 11.418/2006 [1] para o recurso extraordinário e, posteriormente, com a Lei nº 11.672/2008 [2] para o recurso especial. No processo do trabalho, a técnica fora inserida na Consolidação das Leis do Trabalho mediante a Lei nº 13.015/2014, sendo disciplinada no artigo 896-C do mesmo diploma legal. Nesse ponto, verifica-se que a introdução dessa modalidade de julgamento representou no processo do trabalho a preocupação e necessidade de observância das decisões judiciais proferidas pelo Tribunal Superior do Trabalho.

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Interessante apontamento cronológico deve-se ao fato de a promulgação da mencionada lei ter ocorrido antes do Código de Processo Civil de 2015, demonstrando que o processo do trabalho, assim como previsto para o processo comum, deve observar e concretizar os princípios da segurança jurídica, igualdade e razoável duração do processo, por meio da observância dos precedentes judiciais. Nesse ponto, ainda que o processo civil tenha aplicação subsidiária, a relevância das alterações promovidas pela referida lei não pode ser ignorada.

Recorda-se, por relevante, que os grandes mentores da elaboração do projeto de lei que deu origem à norma foram os ministros do TST. Isso porque, na “Semana do TST”, instituída pela RA nº 1.448/2011 e realizada em maio de 2011, com o objetivo de promover reflexões acerca da prestação jurisdicional da Corte, fora elaborado pelos ministros um projeto, posteriormente encampado pelo deputado federal Valtenir Ferreira, o qual terminou, após algumas alterações, por resultar na Lei nº 13.015/2014. [3]

Após a entrada em vigor do C de 2015, diante da redação do artigo 927, III, deste diploma, revelou-se a importância das decisões proferidas em incidentes de recursos repetitivos, já que devem ser observados pelos juízes e tribunais, vale dizer, com observância obrigatória.

Uniformização de jurisprudência do IRR

Ocorre que, não obstante a base legislativa, bem como a preocupação do Tribunal Superior do Trabalho em garantir a uniformização de sua jurisprudência, o instituto do incidente de recursos de revista repetitivos (IRR) não encontrou espaço para ser aplicado nos últimos anos. Enquanto o Superior Tribunal de Justiça nos primeiros 15 anos da edição da lei que instituiu o julgamento de recursos repetitivos julgou mais de 900 incidentes [4], o Tribunal Superior do Trabalho, em 10 anos (a Lei nº 13.015 completou 10 anos em julho de 2024), somava 24 incidentes instaurados [5].

Todavia, o ano de 2024, principalmente o segundo semestre, demonstra que o Tribunal Superior do Trabalho, ao que parece, pretende alterar essa realidade para uniformizar a sua jurisprudência de forma mais recorrente. Isso porque, na última sessão do Pleno do TST, ocorrida em 16 de dezembro de 2024, quatro temas foram afetados para julgamento pelo rito dos recursos repetitivos. Somam-se, dessa maneira, aos dois temas afetados na sessão de 5 de dezembro de 2024 da SDI-1 e aos três temas afetados na sessão de 24 de outubro de 2024 também da SDI-1.

Verifica-se, desse modo, que no presente ano (nos últimos dois meses) foram 11 temas afetados, enquanto que no ano de 2023 apenas três temas o foram para julgamento nesta modalidade.

Não se pode olvidar que, em 2024, julgou-se temas de grande relevância, como a aplicação do direito intertemporal aos contratos de trabalho (principalmente a Reforma Trabalhista), sedimentando o entendimento do Tribunal com relação a esta relevante controvérsia, em prazo inferior a um ano da instauração do incidente (afetado em 27/11/2023, julgado em 25/11/2024).

Reforma do Regimento Interno do TST

Nesta linha de entendimento, o Regimento Interno do TST ou por significativa reforma, mediante a Emenda Regimental nº 7, a qual percebeu, segundo a própria justificativa, “a necessidade de atualização e aperfeiçoamento dos mecanismos de uniformização de jurisprudência concernentes a súmulas e precedentes vinculantes firmados em IRR, IRDR e IAC, especialmente após a declaração de inconstitucionalidade da alínea ‘f’ do inciso II do art. 702 da CLT pelo Pleno do TST”.

A referida emenda instituiu (artigos 63-C e 63-D no Regimento Interno), outrossim, a Comissão Gestora de Precedentes, a qual é composta por três ministros, presidida pelo presidente do TST e, dentre outras funções, acompanhará os processos que possuam matéria com potencial de repetitividade ou com relevante questão de direito, de grande repercussão econômica ou social, a fim de propor ao presidente do tribunal medidas para a racionalização dos julgamentos por meio de definições de teses jurídicas em recursos repetitivos ou em assunção de competência.

Ademais, inseriu o §9º no artigo 281 do Regimento Interno do TST permitindo que os TRT’s “sempre que identificar multiplicidade de recursos de revista fundados em idêntica questão de direito, por ocasião do juízo de issibilidade, deverá submeter tal situação à apreciação do Tribunal Superior do Trabalho (…)”, ampliando, desse modo, a possibilidade de identificação de temas relevantes.

Mudança institucional

Diante dessa realidade, é possível perceber a mudança institucional do Tribunal Superior do Trabalho no tocante à uniformização de sua jurisprudência. É certo que tais alterações necessitam de análise cautelosa com o objetivo de compatibilizá-las com a Consolidação das Leis do Trabalho, Código de Processo Civil e, principalmente, a Constituição.

Imperioso que o tribunal possibilite uma ampla participação democrática durante o incidente para concretizar o efetivo contraditório, bem como atente-se para a fundamentação detalhada da decisão paradigma, respeitando a função do Poder Judiciário, qual seja, julgar o caso concreto, ainda que tenha potencial para determinar o entendimento em casos futuros semelhantes.

O ano de 2024 encerra-se com o indicativo de mudança institucional do Tribunal Superior do Trabalho com relação aos precedentes judiciais e uniformização da jurisprudência. Aguarda-se, em 2025, os próximos os e julgamentos para possibilitar uma análise detalhada.

 


[1] Acrescentou ao Código de Processo Civil dispositivos que regulamentavam o § 3º do art. 102 da Constituição Federal (art. 543-A e 543-B do C/73).

[2] Acrescentou ao Código de Processo Civil dispositivos, estabelecendo o procedimento para o julgamento de recursos repetitivos no âmbito do Superior Tribunal de Justiça (art. 543-C do C/73).

[3] BRANDÃO, Cláudio Mascarenhas. Reforma do sistema recursal trabalhista. Comentários à Lei n. 13.015/2014. São Paulo: LTr, 2015. p. 17. Destaca-se, ainda, que a comissão formada no âmbito do TST tinha como objetivo a análise da viabilidade técnica de regulamentação da transcendência no recurso de revista. No entanto, os ministros concluíram que, diante da multiplicidade de temas veiculados no recurso de revista, seria necessário aprovar um anteprojeto de lei alternativo que pudesse sanar alguns problemas do sistema recursal trabalhista. Cf.: DALAZEN, João Oreste. Apontamentos sobre a Lei n. 13.015/2014 e impactos no sistema recursal trabalhista. Revista do TST, ano 80, n. 4. São Paulo: Lex Magister, p. 204, out/dez. 2014.

[4] STJ. Nos 15 anos da Lei dos Repetitivos, STJ comemora mais de 900 acórdãos em demandas de massa

Disponível em: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2023/06082023-Nos-15-anos-da-Lei-dos-Repetitivos—STJ-comemora-mais-de-900-acordaos-em-demandas-de-massa.aspx. o em 17. dez. 2024.

[5] TST. Tabela de Recursos de Revista Repetitivos. Disponível em: https://www.tst.jus.br/web/guest/nugep-sp/recursos-repetitivos. o em 17. dez. 2024.

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