Opinião

Legados da Constituição de 1934

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20 de julho de 2024, 17h20

A história constitucional brasileira é muito rica e envolvente. Neste ano, por exemplo, celebram-se os 200 da Constituição do Império e, também, da Confederação do Equador, movimento constitucional emancipacionista encabeçado pela Província de Pernambuco em defesa das liberdades públicas e contra as arbitrariedades da política imperial de dom Pedro. Também, em 2024, comemora-se outra efeméride constitucional importantíssima para a democracia brasileira: os 90 anos da Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, de 1934.

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Promulgada em 16 de julho de 1934, deixou de vigorar em 10 de novembro de 1937, com o advento do golpe de estado de Getúlio Vargas, quando decretou o Estado Novo e outorgou a Carta de 1937, vulgarmente conhecida como “Polaca”, em função das suas características autoritárias e centralizadoras, que se assemelhavam às constituições da Polônia, especialmente a Constituição Polonesa de 1935.

Já a Constituição de 1934 carrega consigo, até hoje, a pecha de ter sido a mais breve de todas as constituições brasileiras. Sua curta existência, entretanto, não deve ser compreendida como sinal de pouca importância ou de baixo impacto social. Ao contrário, deixou um legado verdadeiramente duradouro, que nenhum outro texto constitucional subsequente ousou ignorar.

Avanços

Em primeiro lugar, deve-se destacar que a Constituição de 1934 se insere num contexto mundial em que o constitucionalismo social ou a caracterizar as novas constituições. Foi em 1934 que, pela primeira vez na história do Brasil, foram previstos os direitos sociais como fundamentais, num claro aceno ao Estado de seu dever de agir em prol da justiça social e da igualdade substancial entre as pessoas. Ainda: inovou no campo das garantias fundamentais ao instituir, em seu texto, o mandado de segurança como ação constitucional destinada à defesa de direito líquido e certo contra ato manifestamente ilegal ou inconstitucional de qualquer autoridade.

Outro avanço foi a instituição da justiça eleitoral (criada pelo Decreto nº 21.076, de 1932), que ganhou foro constitucional e hoje, graças à Constituição de 1934, garante a realização de eleições regulares e legítimas. Tem-se que ressaltar a previsão do direito das mulheres de votarem e serem votadas como garantia constitucional fundamental. Essa é uma conquista civilizacional, ainda que tão tardiamente reconhecida em nosso país.

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Também revolucionou no que tange à organização e funcionamento do Poder Judiciário, reforçando, de um lado o Senado, atribuindo-lhe a função de controlar as decisões de inconstitucionalidade do STF; e, de outro, instituindo a cláusula de reserva de plenário, de modo a reforçar o princípio da colegialidade nas deliberações dos tribunais.

Por fim, ressalte-se a inovação nela prevista do quinto constitucional, regra que autoriza o ingresso de advogados e membros do Ministério Público na magistratura, desde que comprovada sua “reputação ilibada” e “notório conhecimento”. Idealizada como forma de pluralizar o debate e as interpretações jurídicas no âmbito dos tribunais, o quinto constitucional desde então tem reforçado a aproximação entre o Judiciário e a sociedade.

Como pode-se ver, a precocidade de sua agem não fez da Constituição de 1934 uma Carta menor. Antes, a grandiosidade de suas conquistas a elevam à categoria de  um dos grandes marcos jurídicos de nossa história constitucional. Lembrar os seus 90 anos não é favor algum, mas dever de uma cultura jurídica comprometida com os direitos fundamentais, em especial a igualdade social e a democracia.

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