Mudança legislativa apressada traz mais danos do que ganhos, diz Laspro
30 de julho de 2024, 16h45
Um dos segredos do sucesso de qualquer bom texto legislativo está na capacidade do legislador de dotá-lo de normas que proporcionem segurança na busca das soluções para os litígios envolvendo as partes de determinada relação jurídica. No ramo das recuperações judiciais, isso significa garantir, acima de tudo, segurança para credores e devedores. Ocorre que isso só pode ser alcançado com muito debate e negociação — algo que nem sempre ocorre no Brasil.

Para Laspro, reforma feita de maneira açodada traz mais danos do que ganhos
Quem diz isso é o advogado e professor de Direito da Universidade de São Paulo Oreste Laspro. Especialista em recuperação judicial e falências, ele observa que o legisladores brasileiros seguem uma tendência de achar que reformas legislativas feitas de maneira “açodada” podem produzir textos capazes de solucionar questões problemáticas.
“Ainda que haja uma boa vontade do legislador, o fato é que uma legislação modificada rapidamente, sem a devida reflexão, sem amadurecimento do debate, trará mais danos do que benefícios”, disse Laspro em entrevista à série Grandes Temas, Grandes Nomes do Direito. Nela, a revista eletrônica Consultor Jurídico conversa com alguns dos nomes mais importantes do Direito e da política sobre os temas mais relevantes da atualidade.
A ausência de debate foi a principal crítica feita por juristas, magistrados e entidades atuantes no mercado de reestruturação empresarial e insolvência ao Projeto de Lei 3/2024, que foi aprovado na Câmara dos Deputados em abril para atualizar a Lei de Recuperação e Falências. Na visão de Laspro, é por meio do debate que iniciativas do tipo podem projetar, por exemplo, qual impacto as mudanças na legislação terão na prática jurisdicional.
“Por isso, é muito importante que a legislação tenha sido suficientemente debatida antes de sua entrada em vigor. Dessa forma, no momento em que a lei for aplicada, já haverá um mínimo de tranquilidade a respeito da interpretação de cada dispositivo legal.”
O professor observa, por outro lado, que a Lei de Recuperação em vigor já se beneficiou de algum amadurecimento. Segundo ele, isso pode ser constatado nas recuperações judiciais recentes, que têm sido processadas com a devida reflexão, já que os profissionais desse ramo do Direito conhecem bem a lei e o caminho a ser seguido.
“Com essas condições, que só o tempo traz, é evidente que há um aumento vertiginoso dos casos de sucesso, e hoje nós vemos isso claramente. É muito raro vermos hoje o caso de uma grande recuperação judicial que tenha caminhado para o fracasso. Basta que nós lembremos de grandes casos que estão todos os dias na mídia. É possível dizer que todos eles são casos de sucesso, na medida em que credores e devedores chegaram minimamente a um consenso no caso concreto. Hoje não conseguimos nos lembrar de casos de grandes empresas em recuperação que tenham naufragado e caminhado para um processo falimentar.”
Especialização
Por fim, Laspro elogiou o trabalho feito pelas câmaras e varas especializadas em matéria empresarial. Para ele, o Conselho Nacional de Justiça fez um “excepcional trabalho” ao incentivar a criação desses juízos.
“Há câmaras especializadas, em segundo grau de jurisdição, e varas especializadas, em primeiro grau, para as quais são indicados juízes — ou nas quais tomam posse juízes — que conhecem efetivamente a matéria e que são um mecanismo de segurança para o mercado.”
Tal iniciativa, segundo ele, evita que grandes casos de recuperação judicial sejam distribuídas para julgadores que, mesmo que tenham boa vontade para entender os processos, não terão a devida estrutura cartorial, nem assistentes que permitam a eles ter uma dedicação exclusiva às demandas da seara empresarial.
“As pessoas precisam entender que essa é uma legislação absolutamente específica e que merece uma análise aprofundada por parte dos magistrados. E só aqueles que realmente têm condições de se dedicar a essa matéria podem dar ao mercado a segurança que almejamos.”
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