Opinião

O homem na arena: a presidência do ministro Dias Toffoli no STF

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21 de outubro de 2024, 17h23

Durante o biênio 2018-2020, a presidência do ministro Dias Toffoli no Supremo Tribunal Federal destacou-se pela busca contínua de eficiência, modernização e fortalecimento do diálogo institucional. Toffoli conduziu a Corte com uma visão estratégica, introduzindo inovações que moldaram o futuro do tribunal e reafirmando o papel constitucional do STF em tempos de grandes transformações. Sua liderança tornou-se um marco na istração e nos processos, com foco na celeridade e na qualidade das decisões judiciais.

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Este ensaio explora os pilares que definiram sua presidência. Primeiramente, será discutido seu compromisso com a eficiência e a modernização istrativa, que resultaram em uma significativa redução do acervo processual e na digitalização do STF, conferindo mais agilidade à Corte. Em seguida, será abordado o aperfeiçoamento da repercussão geral, que, sob sua liderança, se consolidou como um instrumento fundamental para a uniformização da jurisprudência e a garantia da segurança jurídica. Ademais, será analisado, o fortalecimento da transparência nas deliberações, exemplificado pela ampliação do plenário virtual e pela maior previsibilidade nas pautas de julgamento.

Por fim, será tratada a resposta da presidência de Toffoli aos desafios sem precedentes impostos pela pandemia de Covid-19. Em um dos momentos mais críticos da história contemporânea, Toffoli liderou o STF com coragem e determinação, adotando medidas inovadoras que garantiram o funcionamento contínuo da Corte. A pandemia exigiu resiliência e rápida adaptação, e sua gestão consolidou a capacidade do STF de enfrentar crises globais com responsabilidade e eficiência, deixando um legado duradouro de modernização e prontidão institucional.

Eficiência da gestão

Desde o início de sua presidência, o ministro Toffoli estabeleceu a eficiência como um dos pilares de sua gestão. Em 2019, a Corte registrou uma redução de 19,12% no acervo de processos em tramitação, o menor índice dos últimos 20 anos. Essa diminuição foi alcançada apesar de uma redução orçamentária real de 20% em comparação a 2009, evidenciando um uso mais eficaz dos recursos públicos.

A produtividade do tribunal foi impulsionada por uma combinação de modernização istrativa, gestão estratégica do acervo e a submissão de matérias repetitivas ao regime de repercussão geral. Essa estratégia permitiu ao STF decidir mais casos em menos tempo, reduzindo o número de processos em tramitação sem comprometer a qualidade das decisões judiciais.

Gerenciamento de processos

O gerenciamento eficiente dos processos foi um dos destaques da gestão de Toffoli. Em 2019, o STF proferiu 115.603 decisões, das quais 17.695 foram colegiadas, demonstrando um reforço na colegialidade. O acervo geral de processos em tramitação ao final do ano foi de 31.279, representando uma redução de aproximadamente 50% desde 2016. Essa queda expressiva no acervo processual reflete diretamente as iniciativas voltadas para aumentar a celeridade e a eficácia na tramitação dos processos.

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A adoção de novas tecnologias e sistemas de automação dos fluxos de trabalho foram fundamentais para alcançar esses resultados. Em 2019, a tramitação eletrônica ou a representar 94% do acervo final, refletindo o esforço contínuo de digitalização e modernização da Corte.

Aperfeiçoamento da repercussão geral

Sob a presidência de Toffoli, o instituto da repercussão geral foi significativamente aperfeiçoado. Esse instrumento, introduzido pela Emenda Constitucional nº 45/2004, tem como objetivo assegurar a racionalidade da justiça e a segurança jurídica, garantindo que o STF se concentre em questões de relevância social, política, econômica ou jurídica.

A Emenda Regimental nº 54/2020, implementada durante a presidência do ministro Dias Toffoli, introduziu importantes aperfeiçoamentos na sistemática da repercussão geral no STF, fortalecendo a gestão desse instituto fundamental para a jurisdição constitucional. Entre as principais inovações, destaca-se a possibilidade de qualquer ministro, em caso de omissão do relator, propor a reafirmação de jurisprudência dominante, desde que devidamente fundamentada. Além disso, ou a ser exigido quórum de maioria absoluta para declarar que determinada matéria é infraconstitucional, assim como a manifestação expressa dos ministros nas sessões de julgamento realizadas no plenário virtual, o que aprimorou a transparência e a formalidade dos julgamentos.

A revisão do reconhecimento da Repercussão Geral foi objeto de aprimoramento, assegurando maior rigor no controle de sua aplicação. Igualmente, a gestão dos recursos representativos de controvérsia constitucional, assim como dos feitos julgados pelo STJ sob a sistemática de recursos repetitivos, ou a ser centralizada na Presidência do STF, promovendo uma maior articulação e eficiência entre as instâncias judiciais.

Em 2019, foram julgados 31 temas de repercussão geral, dos quais 24 tiveram o mérito julgado. Esse resultado contribuiu para a uniformização da interpretação constitucional e para a redução do acervo processual, evitando a proliferação de processos sobre matérias já decididas.

Transparência

A transparência foi um dos eixos centrais da gestão de Toffoli, com avanços significativos em várias frentes. A ampliação do plenário virtual e a disponibilização em tempo real dos votos dos ministros no portal do STF são exemplos claros desse compromisso. Essas iniciativas proporcionaram maior previsibilidade e clareza nas decisões do Tribunal, fortalecendo a confiança da sociedade na Justiça.

Além disso, a divulgação semestral das pautas de julgamento do plenário facilitou o acompanhamento dos temas em debate por diversas instituições e pela sociedade civil, promovendo um ambiente de maior participação e diálogo.

Digitalização da Corte

A transformação digital do STF foi acelerada durante o mandato de Toffoli, com a implementação de várias soluções tecnológicas voltadas para a automação e a eficiência processual. A tramitação eletrônica, que já superava a física desde 2013, foi consolidada, representando uma grande parte dos processos em 2019. Esse avanço permitiu a celeridade nas decisões e a redução dos custos operacionais, bem como a melhoria na gestão dos recursos.

O projeto estratégico de Juízo de issibilidade, que ampliou a atuação do Núcleo de Análise de Recursos (Nare) e do Núcleo de Repercussão Geral (Nurg), exemplifica o foco na digitalização e na eficiência. Esse projeto contribuiu para que os ministros pudessem se concentrar em processos de maior relevância, enquanto a Presidência e outras unidades especializadas tratavam dos recursos inissíveis ou inaptos.

Diálogos institucionais com os tribunais nacionais

A gestão de Toffoli destacou-se por uma robusta política de diálogo institucional com outros tribunais nacionais. Essa interação foi essencial para a redução no recebimento de processos pelo STF, que em 2019 registrou uma diminuição de 8% em relação ao ano anterior.

A valorização dos tribunais de origem e o alinhamento institucional foram promovidos por meio de visitas institucionais, cursos de capacitação e cooperação contínua. Essas ações não apenas melhoraram o fluxo de processos entre os tribunais, mas, igualmente, fortaleceram o papel do STF como guardião da Constituição, consolidando a aplicação uniforme da repercussão geral em todo o País.

Enfrentamento da Covid-19: resposta rápida e eficiente

Durante a epidemia de Covid-19, a presidência do ministro Dias Toffoli no STF demonstrou notável capacidade de adaptação e gestão em meio à crise global. O cenário exigiu decisões rápidas e a utilização de tecnologias digitais que já vinham sendo implementadas em sua gestão, permitindo ao Supremo manter sua atuação judicial de forma eficaz e contínua.

A digitalização do tribunal, um dos pilares da istração de Toffoli, mostrou-se fundamental no enfrentamento da pandemia. O plenário virtual, que já estava em uso para julgar processos eletronicamente, foi intensificado para garantir a continuidade dos julgamentos, mesmo com as restrições impostas pelas medidas de isolamento social. Essa inovação foi vital para evitar a paralisação dos trabalhos da Corte, assegurando a celeridade processual durante um período de grande incerteza.

Além disso, Toffoli promoveu um diálogo institucional ativo com os outros poderes da República e os tribunais de origem, coordenando esforços para assegurar a estabilidade institucional e a uniformização das decisões judiciais em temas relacionados ao combate à pandemia. Essa atuação consolidou o papel do STF na garantia dos direitos fundamentais e na mediação de conflitos entre os entes federativos, especialmente em questões como a competência para determinar medidas sanitárias e a alocação de recursos para o sistema de saúde.

A liderança de Toffoli durante a pandemia destacou-se pela rapidez na tomada de decisões e pela ênfase na eficiência e inovação tecnológica, fortalecendo a transparência e a previsibilidade nas deliberações da Corte.

Essas iniciativas garantiram que a Suprema Corte mantivesse sua atuação jurisdicional de forma contínua e eficiente, mesmo diante dos desafios impostos pela crise sanitária.

Assim, o legado de sua gestão modernizou o STF, além de prepará-lo para enfrentar emergências de grande escala com agilidade e responsabilidade institucional.

Conclusão

A presidência do Ministro Dias Toffoli no Supremo Tribunal Federal será lembrada como um período de avanços corajosos e modernização institucional. Inspirado pelo espírito do discurso “A cidadania em uma república”, do presidente Theodore Roosevelt, Toffoli enfrentou os desafios do cargo com determinação, lidando com as adversidades com firmeza e visão. Em momentos de grande pressão, ele não se limitou a observar de fora, mas esteve plenamente envolvido na arena das decisões que moldaram o futuro da Corte.

Ao priorizar eficiência, transparência e inovação, Toffoli guiou o STF por um caminho de modernização, consolidando a digitalização e o aperfeiçoamento da repercussão geral como pilares de uma gestão estratégica e ágil. Assim como o homem que, nas palavras de Roosevelt, “se esforça bravamente”, ele conduziu a Corte com coragem em tempos de incerteza, especialmente durante a crise sanitária global. Sua liderança assegurou que o Supremo Tribunal continuasse a cumprir seu papel constitucional com excelência, mesmo diante de complexidades sem precedentes.

O legado de Toffoli não é apenas o de um eficiente, mas o de um líder que ousou inovar e fortalecer os laços institucionais, garantindo que o STF esteja preparado para os desafios do século 21. Sua presidência elevou a Corte a um novo patamar de excelência, assegurando que ela continue a desempenhar sua missão com legitimidade, celeridade e resiliência.

Autores

  • é conselheira do CNJ, advogada da União, ex-Secretária-Geral da Presidência do STF, ex-Chefe de Gabinete de ministro do STF, doutoranda em Direito pela USP e professora da Escola da AGU.

  • é conselheiro diretor da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), visiting professor na Wolfgang Goethe Universität Frankfurt am Main. Executive Certificate in Public Policy from Harvard Kennedy School University, doutor em Direito pela PUC-SP, mestre em Direito pela UFPR, ex-assessor especial da Presidência do STF e professor da Universidade Nove de Julho.

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