Justiça para as mulheres

TJ-SP aplica norma do CNJ para equilibrar participação feminina

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26 de abril de 2025, 8h15

* Reportagem publicada no Anuário da Justiça São Paulo 2025. A versão impressa está em pré-venda na Livraria ConJur (clique aqui). e a versão digital pelo site do Anuário da Justiça (anuario.conjur.com.br).

Capa da nova edição do Anuário da Justiça São Paulo

A Resolução 525 do CNJ, de setembro de 2023, marcou um dos mais importantes avanços vivenciados pelas mulheres desde que elas ingressaram na magistratura brasileira, em 1939. Em decisão unânime, o Conselho Nacional de Justiça aprovou a norma que criou a política de alternância de gênero no preenchimento de vagas para a segunda instância do Judiciário. A nova regra foi assinada pela ministra Rosa Weber, então presidente do Supremo Tribunal Federal e do CNJ, pouco antes de se aposentar.

A medida contou com relatoria da conselheira Salise Sanchotene, e alterou a Resolução CNJ 6/2010, que trata dos critérios objetivos para a promoção de juízes e juízas. A partir dessa determinação, os tribunais devem mesclar o uso de lista exclusiva, formada apenas por mulheres, com lista mista tradicional nas promoções pelo critério do merecimento para promoção de juízas em segundo grau ao cargo de desembargadora.

As mulheres representam 51,5% da população brasileira. No Judiciário, porém, elas são uma minoria de 40%. Quanto mais alto o cargo na Justiça, menor o número de mulheres. Temos 18,8% de ministras, 29,3% de desembargadoras e 41% juízas de primeiro grau. Os dados são do IBGE e do relatório Justiça em Números 2024, do CNJ. Ainda de acordo com o estudo do CNJ, a média nacional da participação feminina nos tribunais só não é inferior ao de Liechtenstein, principado com 160km2 entre a Áustria e a Suíça, com 27,4%. Na Europa como um todo, as mulheres ocupam 59,7% dos cargos na magistratura, segundo dado de 2022.

Em abril de 2024, a corte promoveu a primeira juíza ao cargo de desembargadora seguindo as determinações relacionadas à paridade de gênero estabelecidas pelo CNJ na Resolução 525. A juíza Maria de Fátima dos Santos Gomes, com mais de 30 anos na carreira, foi promovida pelo critério do merecimento para ocupar a vaga de José Tarciso Beraldo, que se aposentou. Em seu discurso de posse, a desembargadora, que ou a fazer parte da 14ª Câmara do Direito Criminal, comentou que “ao implementar os termos da resolução, o TJ-SP retornou ao seu papel de protagonista de mudanças que impactam de forma positiva a sociedade, sempre buscando a equidade e a Justiça”.

Anuário SP 2025 - página 21

Pioneiras na Justiça brasileira

O pioneirismo de São Paulo é também uma corrida para tirar o atraso da corte que hoje tem apenas 15% de mulheres desembargadoras (17% se consideradas as juízas em segundo grau), abaixo da média da Justiça estadual, que é de 23%.

Mesmo antes da resolução do CNJ, São Paulo já havia posto mãos à obra na busca de equilibrar a balança a favor das mulheres. Em 2024, por exemplo, foram nomeadas 12 desembargadoras. A título de comparação, este é o número de nomeações feitas na década 2004-2013.

“Trata-se não apenas de cumprir a paridade de gênero, como meta estabelecida pela ONU, especialmente como ODS (Objetivo de Desenvolvimento Sustentável) na Agenda 2030, mas também como política transformadora, incômoda, mas necessária e indispensável no esquema de reparação, de inclusão, de representação democrática e de pluralidade feminina”, comenta a desembargadora Maria Cristina Zucchi, presidente da 34ª Câmara de Direito Privado.

De acordo com a Resolução do CNJ, a ação afirmativa deve ser aplicada pelos tribunais de segundo grau das Justiças Estadual, Federal e do Trabalho (excluídos os Tribunais Eleitorais e a Justiça Militar) que ainda não tiverem alcançado o percentual mínimo de 40% de desembargadoras mulheres nas vagas destinadas à magistratura de carreira. A medida é temporária e deve perdurar até que meta seja alcançada.

Já a Resolução CNJ 540/2023 prevê a meta de alcançar 50% de mulheres como juízas auxiliares, em cargos de chefia e assessoramento, na composição de coletivos de livre indicação, em mesas de eventos institucionais, na contratação para estágio, residência jurídica e em contratos de terceirização.

“Em uma carreira eminentemente machista, o caminho está mudando”, afirma Maria Cristina Zucchi, que foi a primeira mulher eleita como titular no Órgão Especial do TJ-SP. “A mulher está conseguindo provar e demonstrar que é capaz de exercer a magistratura com a mesma destreza e competência tradicionalmente reservada aos homens. Os desafios continuam a existir: conceitos geracionais, preconceitos sociais, históricos e culturais, hábitos viciados na cultura excludente de gênero, sobrecarga dos afazeres familiares e domésticos, a criação dos filhos, e uma linha inesgotável de dificuldades e barreiras a serem superadas”, enumera.

“Igualdade de gênero é um tema que está em pauta e ganha relevância, sem que comprometa – isso é muito importante – o aspecto meritório que deve nortear qualquer promoção, qualquer função”, comenta Ligia Bisogni, da 23ª Câmara de Direito Privado.

Diante da norma editada pelo CNJ e aplicada pelo TJ-SP, no entanto, 20 juízes de São Paulo entraram com mandado de segurança contra o concurso de promoção só para juízas. O grupo argumenta que a resolução do Conselho apresenta vícios insanáveis de constitucionalidade e que o concurso baseado em gênero das candidatas fere direito líquido e certo de cada um dos autores do pedido.

O mandado de segurança foi extinto pelo Órgão Especial. O relator, Gastão Toledo de Campos Mello Filho, explicou que o processo estava voltado contra parte ilegítima, já que questionava ato istrativo do presidente do TJ-SP que cumpriu determinação do CNJ.

“As regras foram postas, debatidas, houve uma certa resistência de um lado, às vezes de outro, porém, a partir do momento que ela se tornou obrigatória, o Tribunal de Justiça de São Paulo foi o primeiro a sair e a demonstrar a adoção desse novo modelo”, complementou a desembargadora Ligia Bisogni.

Na Presidência do Tribunal Superior Eleitoral, a ministra Cármen Lúcia deu a sua contribuição ao instituir o Programa Nacional de Incentivo à Participação Feminina na Justiça Eleitoral e à Promoção de Paridade de Gênero nos Tribunais Regionais Eleitorais. A Resolução TSE 105/2025, publicada em março, é um farol orientador para a garantia da paridade de gênero no preenchimento de vagas na Justiça Eleitoral. Pretende promover políticas institucionais que criem um ambiente onde mulheres e homens tenham oportunidades iguais nas unidades istrativas e judiciais, inclusive em posições de liderança e assessoramento. Objetiva ainda aumentar a representatividade das mulheres em eventos da Justiça Eleitoral e como palestrantes.

O movimento em prol da redução da desigualdade de gênero na Justiça brasileira vem se fortalecendo mais amplamente desde 2018, por meio da Resolução CNJ 255, que instituiu a Política Nacional de Incentivo à Participação Institucional Feminina no Poder Judiciário (atualizada em dezembro de 2024 com a publicação da Resolução 540).

“A participação das mulheres nos tribunais enriquece a legitimidade das discussões jurídicas, aumenta a gama de sensibilidade para atingir a melhor solução dos litígios, e propicia a efetiva representatividade da sociedade nos tribunais, com maior pluralidade de perspectivas e experiências nas decisões judiciais”, finaliza Maria Cristina Zucchi.

ANUÁRIO DA JUSTIÇA SÃO PAULO 2025
ISSN: 2179244-5
Número de páginas: 284
Versão impressa: R$ 50, em pré-venda na Livraria ConJur
Versão digital: disponível gratuitamente no app “Anuário da Justiça” ou pelo site anuario.conjur.com.br

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