Tributação de subvenções de ICMS e busca pela equidade fiscal
7 de fevereiro de 2025, 19h38
A Lei nº 14.789/2023 inaugurou um novo regime de tributação das subvenções de ICMS que tem suscitado importantes debates no meio empresarial e jurídico, sobretudo em razão do impacto econômico que essas novas regras podem causar. Trata-se de uma alteração legislativa que substituiu, em grande medida, o antigo modelo de exclusão dos valores referentes aos incentivos de ICMS das bases de cálculo do IRPJ, CSLL, PIS e Cofins pela adoção de uma sistemática de creditamento, cujas exigências e limites têm se mostrado mais onerosos ao contribuinte.
Do ponto de vista constitucional, suscita-se a possível afronta ao pacto federativo, na medida em que os estados, ao concederem incentivos fiscais para fomentar o desenvolvimento regional, veem parte desses benefícios “absorvida” pela União, que exige a tributação sobre valores que originariamente deveriam compor a renúncia fiscal estadual. Esse raciocínio reforça o argumento de que a União estaria exercendo um poder de ingerência indevido, desvirtuando a finalidade do incentivo concebido pelos governos locais para atrair investimentos e promover a geração de emprego e renda em determinadas regiões.
Outro aspecto relevante refere-se às dificuldades práticas de comprovação de que o benefício de ICMS foi efetivamente utilizado para a implantação ou expansão de empreendimentos econômicos, condição necessária para habilitar o creditamento. Em muitos casos, as empresas já amortizaram ou depreciaram todo o investimento realizado no ado, não havendo mais despesa ível de vinculação aos incentivos.
Dessa forma, exclui-se do regime boa parte das subvenções que, embora legítimas à época, deixaram de produzir efeitos na contabilidade corrente e, portanto, não se conformam ao modelo exigido pela nova lei. Tal imposição limita o aproveitamento dos créditos fiscais e, na prática, pode frustrar o objetivo econômico de impulsionar a atividade empresarial.
Nesse mesmo sentido, cumpre destacar que o quantum efetivo do crédito reconhecido ao contribuinte tende a ser substancialmente inferior aos valores incidentes no momento da tributação. A Lei nº 14.789/2023 adota uma alíquota de IRPJ de 25% como referência para a apuração do crédito, sem estender a dedução das bases de cálculo da CSLL, PIS e Cofins, o que, por certo, reflete em menor benefício.
Consequentemente, o contribuinte experimenta uma situação na qual, de um lado, há a imposição de tributo que soma IRPJ, CSLL, PIS e Cofins; de outro, um abatimento limitado, resultando em nítido desequilíbrio econômico-financeiro. Sob uma ótica de justiça fiscal, essa discrepância reforça a necessidade de revisão ou interpretação mais equitativa da legislação, uma vez que a tributação excede o montante do incentivo efetivo.
Crédito presumido de ICMS
Ademais, a hipótese de inclusão do crédito presumido de ICMS no escopo da lei agrava o debate, dada a existência de precedentes no Superior Tribunal de Justiça que asseguram a não incidência de IRPJ e CSLL sobre tais valores, fundamentados na proteção ao pacto federativo. Embora não vinculantes, essas decisões retratam uma linha jurisprudencial que, se confirmada em sede de recurso repetitivo, poderia tornar inviável a tributação de créditos presumidos mesmo depois da promulgação da Lei nº 14.789/2023. Para as empresas, constitui-se, portanto, um cenário de incerteza, em que o caminho do contencioso istrativo e judicial pode ser a única via de salvaguarda contra a cumulação indevida de exigências tributárias.

Por fim, cumpre mencionar a pendência de diversas ações diretas de inconstitucionalidade ajuizadas junto ao Supremo Tribunal Federal. Os autores, em sua maioria entidades de representação empresarial, alegam que os dispositivos legais desrespeitam não apenas o pacto federativo, mas também a isonomia e a livre iniciativa, princípios constitucionais basilares. O exame desses processos pelo STF poderá resultar em pronunciamento definitivo sobre a coerência (ou não) entre o regime de subvenções e a arrecadação da União, a partir de uma visão sistêmica dos valores constitucionais envolvidos.
Em conclusão, a nova regulamentação afeta diretamente a competitividade das empresas, ao impor restrições e condicionantes que podem reduzir a eficácia dos benefícios concedidos pelos entes federativos. Diante desse quadro, parece legítima a postura de questionar judicialmente as restrições constantes na Lei nº 14.789/2023, seja na perspectiva de sua compatibilidade constitucional, seja no que concerne aos limites para o creditamento.
O sucesso das teses defendidas pelos contribuintes depende tanto da articulação coerente dos fundamentos jurídicos quanto da sensibilidade das instâncias superiores, que devem se debruçar sobre o tema na tentativa de estabelecer um equilíbrio entre o poder de tributar da União e a preservação dos incentivos estaduais, indispensáveis ao fomento econômico e social em várias regiões do país.
Encontrou um erro? Avise nossa equipe!