STF tem maioria para analisar crimes permanentes da ditadura em repercussão geral
12 de fevereiro de 2025, 16h07

STF formou maioria pela repercussão geral da discussão sobre a Lei de Anistia
O Plenário do Supremo Tribunal Federal formou maioria para discutir em repercussão geral se a Lei de Anistia (Lei 6.683/1979) também acoberta os chamados “crimes permanentes” cometidos pela ditadura militar, como sequestro e ocultação de cadáver.
A repercussão geral da discussão foi proposta pelo ministro Flávio Dino, relator do caso. Em dezembro do ano ado, ele se manifestou no sentido de que crimes permanentes não são alcançados pela Lei de Anistia, que perdoou delitos cometidos por militares durante o regime de exceção.
“No crime permanente, a ação se protrai no tempo. A aplicação da Lei de Anistia extingue a punibilidade de todos os atos praticados até a sua entrada em vigor. Ocorre que, como a ação se prolonga no tempo, existem atos posteriores à Lei da Anistia”, disse o relator em sua manifestação.
No caso concreto, o Ministério Público Federal denunciou em 2015 Lício Augusto Ribeiro Maciel e Sebastião Curió Rodrigues de Moura, ambos tenentes-coronéis do Exército, buscando a condenação por homicídio qualificado e ocultação de cadáver durante a Guerrilha do Araguaia, no começo dos anos 70.
Motivado pelo caso de Rubens Paiva, Dino se manifestou pela repercussão geral. A Lei de Anistia abrange, em seu âmbito temporal, delitos políticos e a eles conexos ocorridos entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979. Crimes permanentes, no entanto, iriam além do período acobertado pela norma, uma vez que eles continuam sendo cometidos.
Crimes de todos os dias
O argumento em prol da continuidade desses crimes não é difícil de entender: se pessoas assassinadas não tiveram o paradeiro revelado, é porque os corpos ainda estão sendo ocultados. Em casos assim, os crimes continuam sendo cometidos todos os dias. Por isso, não seriam alcançados pela Lei de Anistia, e não estariam prescritos.
Esse ponto de vista foi defendido pelo ministro aposentado Celso de Mello, ex-presidente do STF, em reportagem publicada pela revista eletrônica Consultor Jurídico em janeiro.
“Enquanto não se descobrir o local do sepultamento ou, então, enquanto as pessoas criminosamente sequestradas (‘desaparecidas’) não forem encontradas, referidos crimes continuam projetando-se no tempo, precisamente ante o seu caráter de permanência”, afirmou o magistrado.
“No delito permanente (como os crimes de sequestro, cárcere privado, redução à condição análoga à de escravo, ocultação de cadáver, associação criminosa, posse irregular de arma de fogo e organização criminosa, entre outros), a situação de ilicitude penal se protrai no tempo, pois, como assinala o magistério da doutrina, ‘o agente tem o domínio sobre o momento consumativo do crime’”, prosseguiu ele.
Ainda segundo Celso de Mello, não é possível falar em prescrição de crimes permanentes, uma vez que o autor continua em situação de flagrante delito, segundo o artigo 303 do Código de Processo Penal.
“Vejo, bem por isso, como extremamente importante a proposta do eminente ministro Flávio Dino no sentido de o STF reconhecer a existência de repercussão geral a propósito do tema concernente à possibilidade de punição de crimes permanentes, objeto da Lei de Anistia, considerado seu momento consumativo após 15 de agosto de 1979.”
ARE 1.501.674
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