Em 2024, Judiciário bateu recorde de processos recebidos e julgados
13 de junho de 2025, 8h15
* Reportagem publicada no Anuário da Justiça Brasil 2025, lançado na última quarta-feira (11/6), no STF (clique aqui para assistir ao evento na íntegra). A versão impressa está à venda na Livraria ConJur (clique aqui). e a versão digital pelo site do Anuário da Justiça (anuario.conjur.com.br).

Capa da nova edição do Anuário da Justiça Brasil 2025
Não são poucos os fatores que levaram o Judiciário a registrar aumento, ano após ano durante décadas, do número de casos aguardando julgamento: a democratização do o à Justiça, os direitos conquistados pelo cidadão (e nem sempre entregues pelo Estado), uma população em franco crescimento e as novas leis e tecnologias que alteram o modo como se vive, se relaciona, se trabalha. Tudo isso pode ter elevado o número de casos em aberto, chegando a 84,7 milhões em 2023.
Mas um fator pode ser considerado determinante para que esta seta tenha, pela primeira vez em muito tempo, apontado para baixo em 2024: o início de uma operação para expurgar as execuções fiscais que entopem o Judiciário. O esforço, capitaneado pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Conselho Nacional de Justiça, mas levado a cabo por todos os tribunais, ajudou o acervo do Judiciário a cair 5% em relação ao ano anterior.
Em março de 2025 o total de execuções fiscais liquidadas atingiu 6,3 milhões de casos, o que levou o estoque de ações em tramitação a baixar para 79,6 milhões – o menor número desde 2016. E fato inédito: o número de processos julgados em 2024 (44 milhões) foi maior do que o de casos novos (39 milhões). A tão almejada meta de julgar mais casos do que recebe foi finalmente alcançada em termos globais (leia mais à página 22).
O fato recente que faz acreditar que o Judiciário brasileiro não é um caso perdido de ineficiência é a queda do número de casos pendentes provocado pela liquidação das execuções fiscais. Mas um fato mais remoto, que por sinal está comemorando 20 anos em 2025, contribuiu de forma consistente e persistente para dar tração na operação do sistema de Justiça do Brasil. Trata-se da Emenda Constitucional 45/2004, merecidamente conhecida como a Reforma do Judiciário.

Produtividade da Justiça brasileira em 2024
Depois de sua promulgação pelo Congresso Nacional, as novidades que a emenda instalou já parecem parte da paisagem: a criação dos conselhos nacionais da Justiça (CNJ) e do Ministério Público (CNMP) tornaram ambas as atividades mais transparentes e próximas do escrutínio público. A sistemática de julgamentos por repercussão geral e repetitivos — que, vale lembrar, precisaram ser regulamentados por lei— ajudam a Justiça a uniformizar seu entendimento. E a garantia constitucional de “razoável duração do processo” produziu um esforço concentrado para evitar a paralisia nos escaninhos. O que a reforma fez, em suma, foi criar novos métodos de trabalho judicial, novas regras processuais, que tornaram a Justiça mais eficiente e mais eficaz.
Some-se a isso o ganho de produtividade obtido pela incorporação da tecnologia na tramitação dos processos e temos um Judiciário totalmente remodelado e apto a enfrentar uma demanda que não para de crescer. É reconfortante saber que apenas 5% de processos em tramitação ainda são físicos. E que os casos novos em papel representam 0,6% das entradas.

Nunca a Justiça brasileira recebeu e julgou tantos processos
O resultado é muito positivo. Comparando os dados de movimentação processual dos últimos cinco anos, constata-se que o único fator que inspira preocupação é o crescimento da demanda. O número de casos novos ou de 27 milhões em 2020 para 39 milhões em 2024, um aumento de 63%. A preocupação só não é maior porque, no mesmo período, a resolutividade do sistema cresceu mais ainda – 75%, ando de 25 milhões de processos julgados em 2020 para 44 milhões em 2024.
O problema maior da Justiça está localizado na primeira instância, onde tramitam 93% de todas as ações judiciais dos brasileiros. O que significa, em outras palavras, que de cada 100 ações ajuizadas, seis vão chegar a algum tribunal de segunda instância e ou última instância e apenas um vai alcançar a instância final.
Um indicador da dificuldade maior enfrentada pelos juízes da base do sistema é a relação entre o número de processos julgados no ano e o número de processos à espera de julgamento no mesmo período. Em 2024, as instâncias superiores tinham 5,8 milhões de processos no estoque, mas julgaram 7 milhões – ou seja, precisariam de menos de um ano de trabalho para liquidar o estoque remanescente ao final daquele ano. Na primeira instância, foram 35 milhões de julgados para 73 milhões em estoque, o equivalente a mais de dois anos de trabalho dos juízes.
A boa notícia é que de 7,6 milhões de processos que aguardam conclusão há mais de 15 anos no primeiro grau, 64% são de execuções fiscais, que devem ser extintas em breve, trazendo um alívio para os juízes que operam na base do sistema, como já aconteceu em 2024.

26% dos novos processos são distribuídos na Justiça Estadual
Uma das inovações da Reforma do Judiciário, implantada há 20 anos, foi a ampliação da competência da Justiça do Trabalho. O reconhecimento de sua legitimidade para tratar não apenas das relações de emprego, mas também das relações de trabalho, no entanto, foi corroído pelo tempo e pela tecnologia e está sendo contestado nos tribunais. Teses como a definição de relações laborais diversas daquelas previstas na CLT, como o caso do trabalho por aplicativo, estão saindo da esfera da Justiça do Trabalho para serem fixadas pelo Supremo Tribunal Federal. Como as duas cortes têm adotado entendimentos diferentes sobre a questão, causas trabalhistas hoje são o principal tema entre as reclamações que ingressam na cúpula do Judiciário, caracterizando um drible na Justiça especializada. Em uma corrida para proteger seu legado, o TST agora tenta acelerar a aprovação de repetitivos, para racionalizar seu próprio legado (leia mais à página página 172).
Apesar de menor, este não é o único nem o principal ponto de atrito do STF atualmente. A guerra de poderes, iniciada antes mesmo da posse de Jair Bolsonaro como presidente da República e que era marcada pelo confronto do Executivo com o Judiciário, derivou com o tempo para uma contraposição do Legislativo ao Judiciário.
O estopim dessa guerra foi o chamado orçamento secreto, um esquema obscuro de emendas parlamentares que deu aos congressistas poder para decidir a destinação discricionária de uma parte considerável do Orçamento da União. Provocado, o Supremo, sob a batuta de Flávio Dino, tenta colocar freios na farra orçamentária do Congresso.
Outro ponto de discórdia entre Judiciário e Legislativo são os fatos relacionados à tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro de 2023. Enquanto o Supremo dá andamento ao julgamento dos golpistas, o Congresso, animado por uma ruidosa ala de parlamentares de extrema-direita, pressiona pela anistia dos envolvidos, mesmo daqueles que ainda não foram condenados. O último lance dessa disputa que tem beirado o grotesco foi a iniciativa da Câmara dos Deputados de suspender pela via legislativa o julgamento no STF do deputado Alexandre Ramagem por seu envolvimento na trama golpista. O STF já considerou inconstitucional a medida da Câmara, mas o presidente da casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), insiste.

Há mais frentes de atrito que aumentaram a distância entre as duas casas da Praça dos Três Poderes. Numa delas, o Congresso Nacional começou a tramitar uma proposta de emenda constitucional proibindo a posse de qualquer quantidade de entorpecente, semanas depois de o STF garantir que a posse de pequenas quantidades de maconha não seria definido como crime de tráfico. Em outra, os parlamentares restabeleceram o marco temporal para demarcação das terras indígenas em resposta a uma decisão de 2023 da Suprema Corte que havia declarado a inconstitucionalidade do dispositivo. Diante da inércia do Congresso frente a um dos temas mais desafiadores para a sociedade na atualidade, é a Suprema Corte também que está tratando de definir os limites da responsabilidade das big techs na produção e distribuição de informação pela rede mundial de computadores.
Dentro da principal corte do país, foram 115 mil casos julgados em 2024. As decisões colegiadas somaram 24 mil, tomadas em Plenário e nas duas turmas. A 1ª Turma está sob os holofotes por tornar réus os envolvidos nos atos de 8 de janeiro, mas não apenas: com uma postura mais pró-acusação em temas de Direito Penal, os ministros definiram que são válidas as buscas pessoal e domiciliar feitas pela guarda municipal em casos relacionados a tráfico.

A 2ª Turma definiu que o Ministério Público não pode requisitar dados à Receita Federal sem autorização judicial. Ao tratar de Direito Penal, por exemplo, os ministros entenderam que configura fundada suspeita a conduta de pessoa que muda a direção ao ver uma viatura de polícia.
Cada um dos 11 ministros acabou desenvolvendo uma agenda própria: André Mendonça tenta descolar a sua imagem de ministro escolhido por Jair Bolsonaro com a pauta ambiental, sendo o responsável por acompanhar o planejamento de combates ao desmatamento e incêndios na Amazônia e no Pantanal; Cármen Lúcia precisou rever o que considera ser “liberdade de expressão” ao assumir a Presidência do TSE; e Fachin manteve duras mensagens sobre ações policiais em favelas.
Responsável pelo maior volume de julgamentos entre as cortes superiores, o Superior Tribunal de Justiça tenta manter as rédeas de um acervo que cresce quase desordenadamente. Esperando o Congresso aprovar uma proposta de lei que limita quais ações podem ingressar, o STJ tenta soluções domésticas, como um regimento mais austero ou mesmo uma presidência mais rígida — é ela quem rejeita ou distribui os casos.

Isso ainda não impediu que em 2024, o primeiro sob a presidência de Herman Benjamin, a entrada de casos distribuídos e registrados crescesse 14% em relação ao ano anterior. Em fevereiro de 2025, o STJ registrou 89.024 decisões proferidas, o que representa uma a cada 27,2 segundos. Só o gabinete de Benjamin assinou 33.250 delas, ou uma a 73 segundos.
Até a mais discreta das estrelas das cortes superiores ou a brilhar mais forte, por outras razões: o Superior Tribunal Militar voltou a ser presidido pela primeira mulher ministra em seus 217 anos de existência. A chegada de Maria Elizabeth Rocha ao comando do STM não é apenas protocolar — com uma agenda abertamente feminista e inclusiva, a ministra tenta quebrar a aura hermética da corte, que concentra apenas uma fração ínfima de casos.
ANUÁRIO DA JUSTIÇA BRASIL 2025
19ª Edição
ISSN: 2179981-4
Número de páginas: 256
Versão impressa: R$ 50, em pré-venda na Livraria ConJur
Versão digital: disponível gratuitamente no app “Anuário da Justiça” ou pelo site anuario.conjur.com.br
O Anuário da Justiça Brasil 2025 contou com o apoio da Fundação Armando Alvares Penteado — FAAP.
Anunciaram nesta edição do Anuário da Justiça Brasil:
Adriana Bramante Advogados Associados
Advocacia Amanda Flávio de Oliveira
Advocacia Fernanda Hernandez
Arruda Alvim & Thereza Alvim Advocacia e Consultoria Jurídica
Ayres Britto Consultoria Jurídica e Advocacia
Basilio Advogados
Bergamini Advogados
Bermudes Advogados
Bialski Advogados Associados
Bottini & Tamasauskas Advogados
Bradesco S.A.
Carneiros Advogados
Cecilia Mello Advogados
Cesa – Centro de Estudos das Sociedades de Advogados
Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil
Corrêa Advogados
Legal Claims
D’Urso & Borges Advogados Associados
Dias de Souza Advogados
FAAP
Fidalgo Advogados
Gomes Coelho & Bordin Sociedades de Advogados
Gueller e Vidutto – Sociedade de Advogados
Hasson Sayeg, Novaes e Venturole Advogados
Heleno Torres Advogados
JBS S.A.
Laspro Consultores
Lucon Advogados
Machado Meyer Advogados
Marcus Vinicius Furtado Coêlho Advocacia
Maria Fernanda Vilela & Advogados
Mauler Advogados
Milaré Advogados
Moraes Pitombo Advogados
Moro e Scalamandré Advocacia
Mubarak Advogados
Multiplan
Nelio Machado Advogados
Ordem dos Advogados do Brasil – São Paulo
Palheiro & Costa – Sociedade de Advogados
Pardo Advogados Associados
Perez e Rezende Advogados
Procópio de Carvalho Advocacia
Refit
SOB – Sacramone, Orleans e Bragança Advogados
Tavares & Krasovic Advogados
Tojal Renault Advogados
Warde Advogados
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