Opinião

Um curso de pós-graduação na Unesp e um ipê amarelo em Franca

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10 de maio de 2025, 15h21

Durante muitas décadas, a única universidade estadual paulista a manter curso de Direito foi a USP ( Universidade de São Paulo ). Somente em 1984 logrou a Unesp (Universidade Estadual Paulista) instituir o segundo curso jurídico público, em seu campus de Franca.

Divulgação

Uma vez criado o curso de graduação, fazia-se necessário atrair docentes capacitados em Direito para a referida cidade, a 401 quilômetros da capital. De um lado, naquela época, as universidades públicas paulistas já exigiam professores com formação pós-graduada; de outro, os cursos desse nível ainda eram embrionários no Brasil, s a poucos centros urbanos.

Em 1987, a primeira turma de Direito da Unesp preparava-se para cursar o quarto ano do bacharelado e buscava um docente de Direito Internacional. O então professor catedrático e chefe do respectivo departamento, na Velha Academia do Largo de São Francisco, Vicente Marotta Rangel, instado a ajudar na busca, pediu a João Grandino Rodas que iniciasse o curso em Franca, enquanto ele procurava um professor permanente.

Sendo o referido professor, à época, juiz federal titular da 15ª Vara Federal de São Paulo e professor livre-docente na Faculdade de Direito da USP, já possuía dois vínculos públicos e não poderia acumular mais um. Decidiu, então, ir a Franca, cidade que ainda não conhecia, para prelecionar interinamente. Chegando ao prédio do antigo Colégio Nossa Senhora de Lourdes, em que funcionava o curso de Direito, ou a lecionar Direito Internacional às segundas-feiras, nos períodos matutino e noturno.

Cativado pelo calor humano dos professores, alunos e funcionários, foi prolongando sua estada, ao mesmo tempo em que ou a se preocupar com a manutenção da excelência do novel curso. Imaginou a criação de um curso de pós-graduação em Direito, stricto sensu, em nível de mestrado, para formar professores e pesquisadores em Direito.

Sua primeira batalha, que durou um ano e meio, foi convencer o pró-reitor de pós-graduação da Unesp a abraçar a causa, apesar de o curso de Direito estar ainda para formar a sua primeira turma. A segunda foi incentivar formandos das primeiras turmas a se candidatarem ao mestrado da Faculdade de Direito da USP, o que, apesar da distância, foi bem sucedido. Subsequentemente, convidou cerca de 15 professores doutores da própria USP, da PUC de São Paulo e da Universidade Mackenzie a estruturar, com ele próprio, um programa de mestrado e a compor, graciosamente, o corpo docente do referido programa, a ser submetido à Capes/Ministério da Educação.

Spacca

O programa foi aprovado, tendo iniciado seu funcionamento em 1990, sendo eleito para coordená-lo João Grandino Rodas. Esse programa foi consolidado, com o empenho de docentes e antigos alunos de Franca e agregou, posteriormente, o nível de doutorado; sendo hoje muito disputado, devido ao seu alto nível.

Ipê amarelo

As universidades públicas paulistas, zelando pela titulação de seus professores, exigem que seus departamentos sejam compostos por professores doutores, livres docentes (adjuntos) e titulares. Em assim sendo, o professor João aceitou deixar de receber seu salário da USP, para, contratado pela Unesp, poder concorrer, o que fez vitoriosamente, no concurso para professor titular de Direito Internacional.

Nos primórdios heroicos do curso de Direito, os professores não habitantes de Franca hospedavam-se em uma dependência no térreo do prédio do colégio, guarnecida de beliches e de um banheiro. Aumentando o seu pertencimento, o professor optou por comprar um terreno na região central, precisamente na rua Saldanha Marinho, construir um pequena casa e assinalá-la com um ipê amarelo na calçada à frente.

Como é do conhecimento geral, tanto o curso de bacharelado (já com 40 anos) quanto o programa de mestrado e de doutorado da Unesp (com mais de 30 anos) possuem grande renome e atraem alunos de todo Brasil. Isso deve-se aos seus professores, alunos e funcionários, que divisaram a potencialidade do curso criado no extremo nordeste do estado de São Paulo e cumpriram, com desvelo, suas respectivas missões.

O professor João permaneceu ensinando em Franca por seis anos, somente afastando-se quando convidado para pesquisar, por dois anos, no Max Planck Institut für Ausländisches und Internationales Privatrecht, de Hamburgo (Alemanha), a que se seguiu uma dezena de anos em Brasília. Primeiramente, chefiando a Consultoria Jurídica do Ministérios das Relações Exteriores e, após, como presidente do Conselho istrativo de Defesa Econômica (Cade).

Antigos alunos do curso de Direito da Unesp, que já formou inúmeras turmas, contribuem, atualmente, para o progresso do Brasil, em várias partes do território nacional.  Os que ficaram na cidade juntaram-se, recentemente, a vereadores francanos, em especial a Daniel Bassi (presidente da Câmara Municipal de Franca) e Marcelo Tidy, que aprovaram a concessão do título de cidadão de Franca ao professor João, que será entregue no dia 23 de maio de 2025, às 19h, no Plenário da Câmara Municipal de Franca (rua da Câmara, 01 — Parque das Águas).

João Grandino Rodas não acedeu, na Unesp, aos píncaros que seus 45 anos de docência na USP o brindaram (direção da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco e Reitoria da Universidade), mas deixou em Franca seu afeto, um curso de referência em pós-graduação e um ipê amarelo.

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