Opinião

Brasil e China: uma nova integração jurídica e tecnológica

Autor

  • é advogado especialista em Direito Penal Econômico; mestre em Direito das Relações Internacionais Econômicas e doutor em Direito Comercial pela PUC/SP. É professor escritor e autor de livros. É presidente do Instituto Sociocultural Brasil/China (Ibrachina) e do Instituto Brasileiro de Ciências Jurídicas (IBCJ). É diretor do Centro de Estudos de Direito Econômico e Social (CEDES). É presidente da Coordenação Nacional das Relações Brasil/China (CNRBC) e da Comissão Especial Brasil/ONU de Integração Jurídica e Diplomacia Cidadã para implementação dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (CEBRAONU) ambos órgãos do Conselho Federal da OAB.

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11 de maio de 2025, 15h24

As relações entre Brasil e China am por uma profunda transformação. Se antes a parceria bilateral concentrava-se nos campos do comércio e da infraestrutura, hoje o direito emerge como um novo e estratégico eixo de cooperação. Essa evolução tornou-se ainda mais evidente durante a missão institucional que realizei à China, em março de 2025.

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Na China-Brazil Legal Conference, realizada em Xangai, discutimos com juristas brasileiros e chineses os desafios contemporâneos da resolução de disputas, o papel crescente da arbitragem em um mundo em constante mudança, além de temas como inteligência artificial aplicada ao direito, tecnologia jurídica e transformação digital do sistema de Justiça. O evento, promovido pela Shanghai Law Society, em parceria com a East China University of Political Science and Law e a PUC-SP, simbolizou o fortalecimento de uma agenda bilateral que integra direito e tecnologia.

Essa agenda já se concretiza em ações práticas. Em 2024, o Supremo Tribunal Federal assinou um acordo de cooperação com a Suprema Corte da China, com foco na aplicação de inteligência artificial no sistema judiciário visando mais eficiência, agilidade e transparência. A China opera com tribunais digitais, plataformas online de mediação e sistemas automatizados de análise jurídica, evidenciando como a tecnologia pode democratizar o o à Justiça.

O Brasil também avança nessa direção. Segundo o Distrito Lawtech Report 2024, o país já conta com mais de 300 lawtechs, representando um crescimento de 23% em dois anos. Soluções como automação processual, análise preditiva e mediação online vêm se consolidando, criando uma base sólida para o diálogo com práticas jurídicas globais de ponta.

Formação de lideranças jurídicas

Formar novas lideranças jurídicas é fundamental nesse processo. Em Xangai, tive a oportunidade de acompanhar o desempenho notável de equipes brasileiras em moots internacionais — com destaque para as universidades do Amazonas e da PUC-SP —, demonstrando que o Brasil forma juristas aptos a atuar em um ecossistema jurídico global, colaborativo e inovador.

Na etapa de Hong Kong da missão, participamos do principal evento do East Vis Moot, competição internacional de arbitragem simulada, com a presença de universidades do mundo inteiro e de renomados especialistas. Nos side events que acompanham o torneio, o foco foi a resolução alternativa de conflitos, tema crucial para empresas brasileiras que buscam expandir seus negócios na Ásia. A arbitragem e a mediação oferecem segurança jurídica, previsibilidade e proteção a investimentos. O Brasil já conta com centros de arbitragem consolidados, mas pode avançar ainda mais ao incorporar experiências chinesas que combinam inovação regulatória com fortalecimento institucional.

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Nesse contexto, a ratificação da Convenção de Singapura surge como um o decisivo. Assinada pelo Brasil em 2021 e atualmente em tramitação no Congresso, a convenção permitirá que acordos de mediação tenham validade e força executiva nos países signatários. Trata-se de um avanço relevante para ampliar a segurança jurídica e consolidar a mediação como um dos pilares na resolução internacional de disputas.

A China é um exemplo nesse campo: a mediação é amplamente utilizada por empresas privadas e estatais como forma eficiente e sustentável de resolução de conflitos. Seguir essa trilha poderá fortalecer a competitividade brasileira e reforçar o protagonismo do país no cenário jurídico internacional. Vale destacar que Hong Kong sediará a recém-criada International Organization for Mediation (IOM), voltada a promover o uso da mediação em contratos internacionais e estimular a cultura da conciliação global.

Cooperação entre Brasil e China

Simultaneamente, Brasil e China avançam em sua cooperação científica e tecnológica. A agenda bilateral lançada em dezembro de 2024 prevê parcerias estratégicas nas áreas de inteligência artificial, governança digital, proteção de dados e propriedade intelectual, demonstrando que essa integração extrapola o campo econômico e contribui para a construção de novos marcos jurídicos globais.

Adicionalmente, está em estudo a criação de um programa de intercâmbio entre a Shanghai Law Society e a Ordem dos Advogados do Brasil, que incluirá advogados, escritórios de advocacia, fóruns, conferências e cursos. Trata-se de uma oportunidade histórica. O direito pode — e deve — ser um elo estratégico na relação sino-brasileira, promovendo estabilidade institucional, desenvolvimento sustentável e soberania.

Para isso, é essencial investir na formação de quadros jurídicos, no intercâmbio acadêmico e profissional, e em uma diplomacia jurídica mais ativa. A integração entre Brasil e China é um projeto em andamento. E a ratificação da Convenção de Singapura representa um o estratégico para consolidá-lo e posicionar o Brasil no centro da nova ordem jurídica global.

Autores

  • é advogado, presidente da Coordenação Nacional das Relações Brasil-China da OAB Federal, vice-presidente de Assuntos Internacionais da Comissão de Direitos e Prerrogativas da OAB/SP, vice-presidente da Comissão Especial de Infraestrutura da OAB/SP, conselheiro estadual da OAB/SP, doutor em Direito Comercial pela PUC/SP, presidente do IBCJ (Instituto Brasileiro de Ciências Jurídicas) e do Instituto Sociocultural Brasil-China (Ibrachina) e vice-presidente do CEDES (Centro de Estudos de Direito Econômico e Social).

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