Paten: inovação regulatória, finanças sustentáveis e transações tributárias
30 de maio de 2025, 16h23
A sanção da Lei nº 15.103, de 22 de janeiro de 2025, que cria o Programa de Aceleração da Transição Energética (Paten), representa um marco para a política energética brasileira e sinaliza a convergência entre sustentabilidade, inovação e responsabilidade fiscal.

A partir de instrumentos financeiros inteligentes, de um modelo de governança interinstitucional colaborativa e do estímulo à modernização de matrizes energéticas, o Paten se alinha aos compromissos globais de redução de emissões e ao fortalecimento de práticas ESG (ambientais, sociais e de governança), bem como aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030.
Objetivos estruturantes
O Paten se consolida como um programa de fomento coordenado pelo Poder Executivo, com metas ambiciosas de descarbonização, diversificação da matriz energética e inovação tecnológica.
Entre seus objetivos principais, destacam-se:
– Aproximar instituições e estimular o financiamento de projetos de desenvolvimento sustentável — especialmente aqueles voltados à infraestrutura, à pesquisa e ao desenvolvimento tecnológico.
– Permitir e otimizar a utilização estruturada de créditos detidos por empresas privadas perante a União (inclusive precatórios e créditos tributários, como créditos de IPI, PIS/Cofins e Cofins-Importação) como garantias para financiamentos — ampliando significativamente as alternativas de lastro para a alavancagem de recursos.
– Promover a geração e o uso eficiente de energia de baixo carbono, apoiando a reconversão econômica em regiões carboníferas e fomentando cadeias produtivas ligadas à economia verde.
A amplitude dos setores beneficiados — que vai da produção de biocombustíveis ao hidrogênio de baixa emissão, ando por tecnologias de armazenamento de energia, fertilizantes nitrogenados e modernização da infraestrutura logística — reforça o caráter transversal e estratégico do Paten.
Ele atua como catalisador de investimentos, ao mesmo tempo em que reduz a dependência de fontes fósseis, fomenta novos polos de desenvolvimento e amplia a competitividade do Brasil no mercado global.
A lei estabelece, no contexto da transição energética, um conceito amplo de “projetos de desenvolvimento sustentável” (artigo 3º), contemplando desde a produção de combustíveis limpos, a modernização de sistemas logísticos e o avanço da infraestrutura, até a capacitação técnica e profissional de trabalhadores e empreendedores.
Essa dimensão de qualificação, inclusive, é de essencial importância e deve ser amplamente compreendida e implementada para garantir que a transição energética seja também inclusiva, criando oportunidades de emprego, renda e geração de valor social em paralelo ao progresso ambiental e econômico.
Fundo Verde: alavanca financeira e redução de custos
O coração financeiro do Paten é o Fundo de Garantias para o Desenvolvimento Sustentável (Fundo Verde). De natureza privada e istrado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o fundo utiliza créditos detidos pelas empresas contra a União — como precatórios e créditos tributários já reconhecidos — para prover garantias em financiamentos a juros baixos e longos prazos.
Essa engenharia financeira cria um ciclo virtuoso:
– Potencializa a ativação de créditos que antes poderiam estar paralisados, convertendo-os em instrumentos de fomento a investimentos produtivos.
– Mitiga riscos para os agentes financeiros, estimulando maior capilaridade de crédito e taxas de juros mais baixas.
– Promove segurança jurídica, ao vedar o uso de créditos ainda em disputa judicial — um ponto essencial para manter a integridade e a previsibilidade dos processos de financiamento.
Além disso, a possibilidade de transferir cotas do fundo a outras entidades — ou reaver os créditos mediante o cancelamento das cotas, desde que resguardada a cobertura das operações contratadas — confere flexibilidade e adaptabilidade ao instrumento, algo inédito no ordenamento financeiro nacional.
Transação tributária sustentável: integração entre política fiscal e climática
Um dos aspectos mais inovadores do Paten é a articulação entre a política fiscal e a política de transição energética.
A lei permite que empresas com projetos de desenvolvimento sustentável aprovados submetam propostas de transação individual de débitos fiscais, nos termos da Lei nº 13.988/2020, com flexibilidade para considerar o cronograma de desembolso e as receitas futuras dos projetos.
A nova vertente legal de “transação tributária sustentável” representa um marco na convergência entre responsabilidade fiscal e climática, rompendo com a visão tradicional de que a transação tributária é apenas um mecanismo arrecadatório.
De acordo com o § 13 do artigo 11 da Lei nº 13.988/2020 (Transações Tributárias), acrescido pela Lei nº 15.103/2025 (Paten), a a ser necessário “perseguir efeitos socioambientais positivos” a partir das concessões recíprocas — criando, assim, um vetor real de impacto ESG no campo tributário.
Para empresas e operadores jurídicos, essa ferramenta amplia significativamente as possibilidades de reestruturação fiscal, vinculando-a diretamente à capacidade de gerar valor ambiental, social e econômico.
CT-Paten e governança regulatória e participativa
A Resolução do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) de 18 de fevereiro de 2025 instituiu o Comitê Técnico do Paten (CT-Paten), que tem como missão coordenar e acompanhar a regulamentação, a execução e a supervisão do programa.
Presidido pelo Ministério de Minas e Energia (MME), o CT-Paten integra representantes de diversos ministérios estratégicos (Fazenda, Meio Ambiente, Desenvolvimento, Portos e Aeroportos, Transportes, Agricultura, Planejamento, entre outros), além de contar com a participação de Estados, da sociedade civil e da academia.
Essa governança participativa garante:
– Critérios de aprovação de projetos que reflitam os compromissos ambientais e sociais do Brasil.
– Acompanhamento técnico-científico constante.
– Diálogo público-privado transparente e estruturado — fator essencial para consolidar o Paten como política de Estado e evitar retrocessos conjunturais.
Além disso, o CT-Paten trabalhará para propor normas que detalhem a operacionalização do Paten e o funcionamento do Fundo Verde — incluindo, por exemplo, a forma de integralização de créditos e as diretrizes para a elegibilidade dos projetos.
Impactos setoriais: agro, logística e transporte em evidência
A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) destacou que o Paten reforça o compromisso do agronegócio com a economia de baixo carbono.
Além de valorizar o agro como fornecedor de matérias-primas para biocombustíveis (etanol, biodiesel e biometano), o programa fomenta tecnologias de baixo carbono, modernização da infraestrutura portuária e integração de sistemas de transporte.
No setor de transporte e logística, historicamente grandes emissores de carbono, o Paten viabiliza investimentos para conversão de frotas (caminhões, ônibus e máquinas agrícolas) ao biometano, gás natural e outros combustíveis renováveis, incluindo a instalação de postos próprios de abastecimento e corredores logísticos sustentáveis.
Essa abordagem integrada cria um ambiente de negócios favorável para a modernização e a competitividade internacional, além de reduzir a dependência de combustíveis fósseis.
Vetos presidenciais: equilíbrio fiscal e foco ambiental
A Presidência da República vetou parcialmente dispositivos do projeto de lei que originou a lei do Paten, com fundamentação em inconstitucionalidade e contrariedade ao interesse público.
Os vetos incluíram trechos que poderiam comprometer a realocação de recursos essenciais para pesquisa e eficiência energética (como no artigo 18), além de dispositivos que permitiriam a destinação de recursos do Fundo Nacional sobre Mudança do Clima (FNMC) a investimentos não plenamente alinhados à Política Nacional sobre Mudança do Clima (artigo 20).
Esses vetos, conforme manifestado pela Casa Civil, refletem a busca de equilíbrio entre a expansão dos instrumentos de financiamento e a observância aos princípios constitucionais de responsabilidade fiscal e gestão eficiente dos recursos públicos.
Conexão com Marco Regulatório do ESG e agenda global
A Lei nº 15.103/2025 e o Paten dialogam diretamente com a visão e os esforços do Marco Regulatório do ESG para o Desenvolvimento Sustentável (MRESG), em consulta continuada disponibilizada na plataforma eletrônica ESG20.org pelo Instituto Global ESG, pela Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais (Abrig) e por atores públicos e privados em rede de atuação, no âmbito do Programa ESG20+ e no contexto do Movimento Interinstitucional ESG na Prática, assim como da Frente Parlamentar ESG na Prática do Congresso Nacional (FPESG) e da Coalizão Sustentável – Rede ESG de Frentes, Grupos e Órgãos.
Ambos têm como escopo central integrar a governança socioambiental e econômica à legislação nacional, além de estimular a implementação prática dos pilares ESG como fatores concretos de redução de riscos, aumento de eficiência e, sobretudo, de o a novos mercados, otimização fiscal e tributária e fontes diferenciadas de financiamento.
Considerações finais e perspectivas para o Brasil
A Lei nº 15.103/2025 representa um divisor de águas para o Brasil, ao integrar o fomento ao desenvolvimento sustentável com a racionalização fiscal e a criação de instrumentos financeiros de última geração. Com o Paten, o país consolida um caminho de prosperidade sustentável, reduzindo emissões e ampliando a competitividade internacional.
Para empresas, operadores jurídicos e agentes econômicos, o Paten oferece uma oportunidade única: transformar créditos potencialmente estagnados em alavancas de inovação, usar a transação tributária como instrumento de impacto positivo e integrar-se a cadeias globais cada vez mais exigentes em critérios ESG e essência sustentável.
Nesse sentido, o programa sinaliza, tal como é compreendida a missão convergente do Movimento Interinstitucional ESG na Prática, que as iniciativas de desenvolvimento sustentável com governança socioambiental (ODS/ESG) não devem ser vistos como um “custo” ou um mero vetor de “imagem institucional”, mas um eixo central para crescimento econômico — consolidando o Brasil como protagonista na nova economia verde global.
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