Olhar viciado

STF julgará validade do reconhecimento pessoal em processo penal

 

17 de março de 2025, 16h56

O Supremo Tribunal Federal vai decidir se o reconhecimento pessoal em processo penal tem validade de prova para definir a autoria de um crime quando o procedimento não seguir o Código de Processo Penal. A discussão, que teve repercussão geral itida (Tema 1.380), busca esclarecer se a prática viola direitos constitucionais, como o devido processo legal, a ampla defesa e a proibição de provas ilícitas.

Fachada do Supremo Tribunal Federal

STF julgará recurso contra condenação baseada só reconhecimento pessoal

O reconhecimento de pessoas no processo penal é um meio de prova utilizado para identificar o autor de um crime ou infração por meio da vítima, de uma testemunha ou de outro acusado. O procedimento é regulamentado pelo artigo 226 do P. O Conselho Nacional de Justiça, por sua vez, editou a Resolução 484/2022 com orientações detalhadas sobre como fazê-lo.

Com a issão da repercussão geral sobre o assunto, o STF julgará o tema de fundo do recurso extraordinário com agravo, que questiona decisões do Tribunal de Justiça de São Paulo que mantiveram a condenação de dois homens por roubo de veículo com emprego de arma de fogo com base apenas no reconhecimento pessoal. A decisão que o Supremo tomar nesse caso deverá ser seguida pelas demais instâncias do Judiciário em situações semelhantes.

O crime ocorreu em 2019, em Campinas. Após ter o carro roubado, a vítima informou à polícia que os criminosos usavam um Celta branco como apoio, mas não forneceu outros detalhes. Os suspeitos foram levados para o reconhecimento pessoal dias após o crime.

Um dos suspeitos apontados foi localizado pela polícia porque estava em um veículo semelhante ao descrito pela vítima. Segundo os autos, o carro já havia sido utilizado em outros crimes, e o homem demonstrou nervosismo, o que levou à sua abordagem. A prisão de ambos foi decretada mesmo sem outras evidências além da identificação feita pela vítima.

A defesa de um dos condenados argumenta, entre outros pontos, que a prova obtida por meio do reconhecimento facial é ilícita porque o procedimento não seguiu as regras estabelecidas no P.

Prova frágil

Ao se manifestar pela repercussão geral da matéria, o presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso (relator da matéria), destacou a fragilidade do reconhecimento pessoal como prova, porque depende de fatores como a memória da vítima e sua capacidade de atenção em situações frequentemente traumáticas ou violentas. O ministro também apontou que, no Rio de Janeiro, 83% dos casos de reconhecimento equivocado resultaram na punição indevida de pessoas negras, evidenciando o caráter discriminatório desse procedimento.

“A dependência excessiva sobre a qualidade dos sentidos de quem é chamado a reconhecer pode levar as pré-compreensões e os estereótipos sociais a influenciarem o resultado do ato”, afirmou Barroso. “O potencial reforço às marcas de seletividade e de racismo estrutural dessa questão sobre o sistema de Justiça Criminal, por sua vez, designa a relevância social e política do tema”.

Barroso também apontou que a jurisprudência do STF não é uniforme quanto à validade do reconhecimento pessoal em desconformidade com o P. “Diante das dificuldades intrínsecas ao reconhecimento pessoal como meio de prova, o debate sobre a obrigatoriedade de procedimento legal cuida essencialmente de definir o alcance de garantias constitucionais para processo e julgamento de pessoas suspeitas da prática de crime. Trata-se de controvérsia com repercussão direta sobre a garantia de investigações criminais justas e igualitárias.”

Não há data prevista para o julgamento do mérito do recurso. Com informações da assessoria de imprensa do STF.

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ARE 1.467.470

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