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STF valida delação de Mauro Cid e nega preliminares da defesa de Bolsonaro

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25 de março de 2025, 18h42

A 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal negou nesta terça-feira (25/3) as preliminares suscitadas pela defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e de outros acusados de participar de tentativa de golpe de Estado. O colegiado decidirá nesta quarta (26/3) se receberá a denúncia da Procuradoria-Geral da República contra os bolsonaristas.

Alexandre garantiu que não interferiu na delação premiada de Mauro Cid

Na sessão desta terça, os magistrados rejeitaram a anulação da delação premiada de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro; o impedimento dos ministros Alexandre de Moraes, Flávio Dino e Cristiano Zanin para julgar o caso; o reconhecimento da competência do Plenário, e não da 1ª Turma, para analisar o processo; e as alegações de cerceamento de defesa.

Os advogados de Bolsonaro e de outros acusados alegaram que não houve voluntariedade na delação. Ou seja, Cid teria sido coagido pela Polícia Federal e por Alexandre, relator do caso, para fazer as declarações contra o ex-presidente e os demais denunciados porque foi preso durante as investigações.

No entanto, Alexandre apontou que a iniciativa de colaborar com as investigações foi de Mauro Cid. Como ele estava preso, fazia sentido que a celebração do acordo implicasse sua liberdade.

O ministro garantiu que não interferiu na forma e no conteúdo da colaboração. Ele afirmou que analisou apenas a regularidade, a voluntariedade e a legalidade da delação, bem como a adequação dos benefícios pactuados àqueles previstos na Lei das Organizações Criminosas (Lei 12.850/2013), e os resultados mínimos exigidos pela norma.

Alexandre aproveitou para alfinetar os acordos de delação firmados na finada “lava jato”. “Não há muito tempo, havia colaborações que previam penas inexistentes. Alguns membros do Ministério Público inventavam sanções, inventavam benefícios.”

Além disso, o relator declarou que convocou Cid para se explicar porque a Lei das Organizações Criminosas permite a rescisão de acordo de cooperação em caso de descoberta de omissões dolosas. Como havia a suspeita de que o militar havia mentido, Alexandre o convocou a se explicar e deixou claro que a descoberta de má-fé poderia levar ao rompimento da colaboração e à volta dele à prisão — algo que está na lei e que não é diferente do que é dito a testemunhas em ações penais, ressaltou o ministro.

Análise na ação

Todos os demais integrantes da 1ª Turma seguiram o voto de Alexandre para validar a delação de Mauro Cid.

O ministro Flávio Dino disse que Alexandre, como relator, tinha a competência para conduzir o depoimento de Cid, não tendo a obrigação de delegá-la a um juiz auxiliar. O ministro Cristiano Zanin afirmou que Alexandre buscou verificar se a colaboração tinha irregularidade que justificasse sua rescisão, o que cabe ao juiz responsável pela homologação do termo.

Já o ministro Luiz Fux ressaltou que as declarações do militar serão submetidas ao contraditório durante a ação penal. Nessa mesma linha, a ministra Cármen Lúcia afirmou que, durante o processo, será possível examinar se as falas do delator são verdadeiras ou não.

Alexandre apresentou dados que mostram que, das 497 condenações pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, 454 são de pessoas com até 59 anos de idade. Entre 60 e 69 anos, foram 36 condenações, e entre 70 e 75 anos, apenas sete.

“Essa narrativa se criou e se repete através de notícias fraudulentas pelas redes socais, fake news, de que são mulheres, só mulheres e idosas (condenadas)“, afirmou o ministro.

Argumentos das defesas

O advogado Celso Vilardi, responsável pela defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), afirmou nesta terça-feira (25/3) que seu cliente não participou de uma trama golpista e que auxiliou na transição do comando das Forças Armadas no final de seu governo.

A declaração foi feita na sessão em que a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal analisa se recebe a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República contra Bolsonaro e outros acusados de tentativa de golpe de Estado. O julgamento prosseguirá na tarde desta terça, com a leitura do voto do relator, ministro Alexandre de Moraes.

Em sua sustentação oral, Vilardi defendeu a nulidade da delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, alegando omissão, contradição e falsidade em seu depoimento. Ele também cobrou o integral às provas do processo. O advogado reconheceu a gravidade dos atos de 8 de janeiro de 2023, mas argumentou que Bolsonaro não poderia ser responsabilizado por eles.

“Eu entendo a gravidade de tudo o que aconteceu no 8 de janeiro. Mas não é possível imputar a responsabilidade ao presidente da República, colocando-o como líder de uma organização criminosa, quando ele não participou dos eventos daquele dia. Pelo contrário, ele os repudiou”, disse o criminalista.

Vilardi citou uma declaração do ministro da Defesa, José Mucio Monteiro, dada ao programa Roda Viva, da TV Cultura, para reforçar sua argumentação. Na entrevista, Mucio afirmou que encontrou dificuldades para estabelecer diálogo com os comandantes das Forças Armadas durante a transição de governo e que precisou da intermediação de Bolsonaro.

“Foi o presidente quem determinou a transição e que os chefes militares atendessem ao novo ministro da Defesa. Não é possível compatibilizar isso com uma tentativa de golpe de Estado ou com o uso do comando militar para tal fim”, declarou o advogado.

Vilardi também reiterou as críticas à delação de Mauro Cid. Segundo ele, o tenente-coronel descumpriu o acordo ao ter trechos de seu depoimento divulgados pela revista Veja.

“O delator rompeu o acordo quando permitiu o vazamento da delação. Ele disse que foi um desabafo, mas esse termo é questionável, pois na própria declaração ele sugere que sua confissão não foi voluntária”, afirmou Vilardi. O advogado ainda criticou a Polícia Federal por apontar que Cid mentiu, omitiu informações e se contradisse.

Vilar ainda sustentou que Jair Bolsonaro deveria ser julgado pelo Plenário do STF. Afinal, os atos supostamente praticados têm relação direta com o cargo e teriam sido praticados em função dele, e que Bolsonaro “chegou a ser investigado quando ainda era presidente”. O criminalista ainda alegou cerceamento de defesa.

Já a defesa de Almir Garnier afirmou que a denúncia contra o ex-comandante da Marinha carece de provas concretas de seu envolvimento na suposta trama golpista. Por sua vez, Matheus Milanez, advogado do general Augusto Heleno, comparou a acusação da PGR a uma “teoria conspiratória”, alegando que não há elementos suficientes que comprovem a participação do general em uma organização criminosa.

Relatório

Alexandre leu, na manhã desta terça, o relatório sobre o processamento da denúncia apresentada pela PGR contra o chamado “núcleo crucial” do que disse ser uma organização criminosa que tentou dar um golpe de Estado.

Logo em seguida, seguindo o rito previsto, foi a vez de o procurador-geral da República, Paulo Gonet, manifestar-se sobre a denúncia que apresentou ao Supremo. Ele reforçou o que já havia escrito, afirmando que Bolsonaro liderou uma organização criminosa para se manter no poder após o fim do mandato.

“A denúncia retrata acontecimentos protagonizados pelo agora ex-presidente da República Jair Bolsonaro, que formou com outros civis e militares organização criminosa que tinha por objetivo gerar ações que garantissem sua continuidade no poder, independentemente do resultado da eleição presidencial de 2022”, resumiu Gonet.

Segundo o PGR, os atos golpistas foram coordenados durante anos, começando em meados de 2021, com o início dos ataques deliberados às urnas eletrônicas e ao sistema eleitoral, e culminando com o 8 de janeiro de 2023, quando apoiadores de Bolsonaro invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes, em Brasília.

Após a manifestação do PGR, foi a vez de as defesas dos oito acusados do Núcleo 1 da trama golpista fazerem suas sustentações orais. Esse núcleo é composto pelos seguintes acusados:

— Jair Bolsonaro, ex-presidente da República;
— Walter Braga Netto, general de Exército, ex-ministro e vice de Bolsonaro na chapa das eleições de 2022;
— General Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional;
— Alexandre Ramagem, ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin);
— Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de segurança do Distrito Federal;
— Almir Garnier, ex-comandante da Marinha;
— Paulo Sérgio Nogueira, general do Exército e ex-ministro da Defesa;
— Mauro Cid, delator e ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.

Todos foram denunciados pelos crimes de organização criminosa armada; tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito; golpe de Estado; dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio público; e deterioração do patrimônio tombado. A soma das penas supera os 30 anos de cadeia.

Caso a denúncia seja recebida, os acusados se tornarão réus no Supremo. Será aberta uma ação penal, com nova instrução do processo, sendo ouvidas testemunhas de acusação e defesa. Somente após essa nova etapa é que deverá ser marcado o julgamento definitivo sobre o golpe de Estado. Com informações da Agência Brasil.

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