Por que os advogados públicos federais estão em greve
4 de fevereiro de 2008, 23h01
Em 2005, o governo, por meio do então advogado-geral da União daquela, Álvaro Augusto Ribeiro Costa, devidamente autorizado pelo presidente da República, comprometeu-se a efetivar a aproximação gradual, em quatro anos, do subsídio constitucional dos membros das carreiras jurídicas da Advocacia-Geral da União e da Defensoria Pública da União daqueles pagos, também pela União, às demais carreiras que integram as Funções Essenciais à Justiça (Título IV, Capítulo IV, CF).
Buscava-se o atendimento ao artigo 37, XII, c.c. artigo 39, parágrafo 1º, da Constituição Federal e o reconhecimento da relevância das atividades desempenhadas para o Estado brasileiro e o êxito até aqui alcançado. Infelizmente, o compromisso, materializado em projeto de lei enviado ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG), restou abandonado em 2006.
Em maio de 2007, o atual advogado-geral da União, José Antonio Dias Toffoli, após nova autorização do presidente da República e acerto prévio com os demais setores do governo envolvidos (Ministérios que integram a chamada Junta Orçamentária), apresentou proposta de lei, objetivando destinar aos advogados públicos federais — e ao aparelhamento da AGU — os honorários advocatícios resultantes da atuação judicial vitoriosa desses, que por lei lhes pertence (Lei 8.906/94) e que vêm sendo apropriados indevidamente pela União. O projeto, apoiado expressamente pelo Conselho Federal da OAB, não teve seguimento no MPOG.
Ainda em setembro de 2007, o MPOG formulou proposta para os membros das carreiras da AGU e da Defensoria Pública da União, objetivando cumprir, de forma parcial e levando-se em conta parâmetros estranhos às demais carreiras integrantes das Funções Essenciais à Justiça, o compromisso descumprido em 2006. Em que pese desatender aos compromissos anteriores, esta proposta restou aceita emergencialmente pelas carreiras, que buscaram compor com o governo, de modo a evitar o acirramento de posições. Nesta ocasião, lhes foi comunicado que a medida provisória correspondente seria editada até 31 de outubro de 2007.
Finalmente, no dia 1º de novembro de 2007, sob exigência governamental, foi assinado Termo de Compromisso entre o governo (MPOG e AGU) e as representações das carreiras jurídicas da AGU e da Defensoria Pública da União, tendo por objeto a reestruturação da tabela de subsídio dos membros dessas Instituições nos termos acordados, com efeitos financeiros a partir de 1º de novembro de 2007 e novo compromisso de edição de medida provisória, desta feita até 8 de novembro de 2007. ada esta nova data, contudo, nada ocorreu, restando mais que configurada a mora governamental.
Deve-se frisar que, em momento algum, o cumprimento do Acordo Coletivo ficou condicionado à sorte da MF ou de qualquer tributo, definitivo ou provisório. Muito ao contrário, as autoridades governamentais envolvidas, em mais de uma ocasião, afirmaram categoricamente que o cumprimento do acordo não se condicionava à prorrogação da MF, que já se encontrava em risco àquela ocasião. Por outro lado, durante a tramitação da PEC, foram editadas medidas provisórias contemplando os policiais federais e do Distrito Federal, concedendo-se reajustes a essas carreiras, consoante compromissos também assumidos pelo mesmo governo.
Não há, portanto, como pretender descumprir o acordo firmado em face da não-prorrogação de um tributo provisório e que restou rechaçado até por segmentos da base política de sustentação do próprio governo. Embora as carreiras da Advocacia Pública Federal lamentem a perda de arrecadação havida, consideram que o caminho para recompor o orçamento não deve ar pelo descumprimento de acordos não sujeitos a condição. A ameaça de descumprimento não apenas legitima medidas extremas dos membros da AGU e da Defensoria Pública da União, inclusive a realização de greve, como poderá render ensejo ao manejo de ações judiciais contra a União e as autoridades envolvidas pelos prejuízos materiais e morais experimentados.
O que deve ser considerado pelo governo, consoante carta aberta publicada pelas representações dos advogados públicos federais, é a importância, para o Estado e para a sociedade, da missão constitucional desempenhada por estes na defesa das rendas, do patrimônio e das políticas públicas federais, bem como dos necessitados. De sua atuação resulta não apenas a economia e a arrecadação de bilhões de reais – 30 bilhões considerando apenas o contencioso perante o STF no ano de 2007 –, mas também a implementação de políticas sociais e econômicas fundamentais para o País e para o povo brasileiro.
Portanto, a readequação do subsídio constitucional dos membros da Advocacia Pública Federal encontra e financeiro na própria atuação vitoriosa destes. Tal medida não decorre do orçamento geral da União, mas da arrecadação de honorários advocatícios. A Advocacia Pública Federal, instrumento fundamental para o incremento da arrecadação tributária e não tributária da União, estará sempre disposta a contribuir com soluções mais adequadas para a recomposição da perda de receitas sofrida, apresentando como lastro deste compromisso os resultados alcançados nos últimos anos, mas espera do Governo que honre com os compromissos assumidos.
O não-cumprimento integral do acordo resultante de proposta do próprio governo colocará em cheque a seriedade das negociações havidas, as quais foram realizadas num ambiente de boa-fé e de confiança nas palavras ditas e escritas pelas partes envolvidas, bem como o futuro das negociações que ainda possam vir a ser realizadas. Neste contexto, é fundamental que a credibilidade institucional seja restituída ao grave cenário, cessando-se de vez as ameaças e as provocações, inclusive as que buscam colocar a opinião pública contra a Advocacia Pública Federal.
Assegurado constitucionalmente, inclusive aos servidores públicos (art. 37, VII, CF), o direito de greve é um legítimo instrumento para se buscar o cumprimento de um acordo firmado com a representação governamental, sendo esta uma das hipóteses previstas na Lei nº 7.783/89 (art. 14, § único, I), aplicável por analogia ao serviço público, consoante decisão do Supremo Tribunal Federal nos Mandados de Injunção 670, 708 e 712. Não se trata, portanto, de uma greve açodada ou abusiva, mas absolutamente necessária, legítima e amparada no Direito.
Encontrou um erro? Avise nossa equipe!