Câmaras Empresariais seguem julgando menos, apesar de sobrecarga no TJ-SP
19 de junho de 2024, 7h47
Dados do primeiro semestre de 2024 mostram que os desembargadores das Câmaras Reservadas de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo seguem recebendo um número muito menor de processos em comparação com as Subseções de Direito Privado da corte.

Dados são consolidados em meio a discussões sobre discrepância na distribuição de processos
Somando apelações e agravos, foram distribuídos pouco menos de 500 feitos para cada desembargador das Câmaras Empresariais, em média, ante a 1,6 mil feitos para cada integrante da Subseção de Direito Privado II.
Na Subseção de Direito Privado I, cada magistrado recebeu quase 1,4 mil casos. Na Subseção de Direito Privado III, foram mais de 1,2 mil por julgador, em média.
Excluídos os agravos de instrumento, foram quase 200 feitos para cada integrante das Câmaras Empresariais, ante a uma média de pouco menos de 900 distribuídos para cada desembargador das Subseções de Direito Privado. A Subseção de Direito Privado II recebeu a maior quantidade de casos: 1 mil feitos para cada magistrado.
Já considerando só os agravos de instrumento, foram distribuídos pouco mais de 300 feitos por magistrado das Câmaras Empresariais, enquanto cada desembargador das Subseções de Direito Privado recebeu uma média de 570 agravos.
O levantamento leva em consideração o período de fevereiro até o 11 de junho de 2024.
Juntas, as duas Câmaras Reservadas de Direito Empresarial contam com 10 desembargadores, enquanto as três Subseções de Direito Privado contam com desembargadores das 38 Câmaras de Direito Privado do Tribunal.
Discrepâncias antigas
Dados consolidados do ano de 2023, levantados pelo próprio TJ-SP e publicados no Diário Oficial mostram que, enquanto as Câmaras Reservadas de Direito Empresarial receberam 16,5 mil processos no ano ado, somente a Subseção de Direito Privado II foram distribuídos 271,3 mil recursos.
Ao todo, a Seção de Direito Privado da corte recebeu 651,5 mil processos no ano ado.
Em 2022, os dados foram semelhantes. Naquele ano, as Câmaras de Direito Empresarial julgaram cerca de 15 mil processos, enquanto somente a Subseção de Direito Privado I analisou quase 200 mil ações. O número total no Direito Privado chegou a quase 600 mil recursos distribuídos.
Desembargadores assinam carta
Em maio, a disparidade levou um grupo de cerca de 40 desembargadores da Seção de Direito Privado a uma carta pedindo a criação de mais duas novas câmaras empresariais e que os magistrados que compõem esses colegiados em a julgar matérias oriundas da distribuição normal em suas respectivas câmaras de origem, ou seja, em a analisar temas além das questões especializadas.
“A despeito das justificativas apresentadas para tal crescimento, o fato é que ocasionou uma desproporção injustificável com as demais seções e, sobretudo, em relação às Câmaras extraordinárias empresariais”, diz o documento. “Os números acima evidenciam flagrante desproporção na distribuição da atividade judiciante da DP II.”
A ideia principal do pedido é desafogar a Seção de Direito Privado, e não acabar com a especialização. A nova sistemática faria com que a distribuição para a seção caísse entre 15% e 17%, segundo apuração da revista eletrônica Consultor Jurídico.
Hoje, são dez desembargadores nas câmaras, com juízes substitutos em segundo grau (os chamados “pinguins”) suprindo as lacunas deixadas por aqueles magistrados com atuação exclusiva nos colegiados empresariais. Com a mudança, esse número saltaria para 20. A carga das câmaras especializadas cairia pela metade com essa mudança, o que impactaria diretamente nas distribuições às três subseções de Direito Privado.
Os desembargadores que assinam o texto afirmam que a criação de mais duas câmaras especializadas seria “para minimizar os efeitos deletérios desta desproporcional distribuição e resgatar o equilíbrio na proporção da divisão racional dos trabalhos”.
Eles citam o caso da Câmara Extraordinária de Meio Ambiente como exemplo de um sistema em que os magistrados julgam casos especializados e também casos oriundos de suas varas de origem.
A distribuição pretendida, segundo o documento, seria de um processo especializado para cada processo que tenha origem na câmara original do magistrado, “salvo melhor juízo”.
Mudança de 2018
Há seis anos, na gestão do desembargador Pereira Calças, o tribunal mudou sua organização e ou a adotar exclusividade na competência dos desembargadores que integram as duas câmaras reservadas de Direito Empresarial.
À época, a ideia era aprofundar a especialização do tribunal, tida por parte da comunidade jurídica como positiva para a celeridade dos processos, tendo em vista que os magistrados são experts nas áreas.
O movimento, no entanto, gerou distorções, e as câmaras empresariais aram a julgar número significativamente menor de recursos. O assunto voltou à tona a partir do início da gestão de Torres Garcia, que tomou posse no começo do ano.
Os números de 2022 e de 2023, que mostraram as discrepâncias nos volumes de recursos julgados pelas câmaras empresariais, fomentaram a discussão na magistratura e na advocacia.
Há quem defenda a criação de novas câmaras, como a carta assinada pelos desembargadores sugere. Mas também há quem queira que fique como está. Existe ainda um outro grupo que defende o fim desses colegiados empresariais.
No começo de abril, a seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP) e a Defensoria Pública do estado enviaram ofícios à presidência do Tribunal de Justiça para apoiar a criação de mais duas câmaras empresariais na corte. As duas instituições defenderam os mesmos argumentos: que há grande disparidade na distribuição de processos na Seção de Direito Privado do TJ-SP.
Na mesma semana, o presidente Torres Garcia publicou resolução que ampliou a competência das câmaras, jogando mais ingredientes no debate.
A resolução incluiu na competência dessas câmaras temas como franquias (Lei 8.955/1994); execuções em sociedades anônimas do futebol (SAFs); e ações que envolvem a Lei Ferrari. Também serão incluídos no rol de competências das câmaras recursos sobre contratos de distribuição, agência e representação comercial.
Ao justificar a resolução, Torres Garcia afirmou que há um “baixo número de recursos que aportam às câmaras empresariais, em flagrante desproporção com as demais subseções”, e que cabe ao TJ-SP “adotar medidas necessárias ao atendimento do princípio da razoável duração do processo e equilíbrio entre os magistrados que as integram”.
À época da publicação da nova diretriz, a ConJur mostrou que a medida foi recebida positivamente, mas que há ressalvas em relação à abrangência dos colegiados, tendo em vista que tratam de temas específicos como recuperação judicial e falência.
A discussão permaneceu intacta: de um lado, a especialização e a exclusividade; de outro, a ampliação das câmaras e das competências dos magistrados que as compõem.
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