Responsabilidade tributária do arrematante em hasta pública: sub-rogação, edital e marco de transmissão
18 de maio de 2025, 17h26
A alienação judicial de bens imóveis em hasta pública, enquanto forma de expropriação forçada, suscita relevante controvérsia acerca da responsabilidade tributária do arrematante. Em especial, debate-se a incidência de débitos anteriores à arrematação e a eficácia jurídica da cláusula editalícia que transfere tais ônus ao adquirente.

O artigo 130, parágrafo único, do Código Tributário Nacional dispõe que, na hipótese de arrematação em hasta pública, os créditos tributários relativos a impostos cujo fato gerador seja a propriedade, domínio útil ou posse de bens imóveis sub-rogam-se no respectivo preço da arrematação. A norma visa garantir a higidez da arrematação e a atratividade do procedimento executivo.
Por outro lado, o artigo 886, VI, do C/2015 exige que o edital de leilão indique a existência de ônus e pendências sobre o bem, o que tem sido utilizado como fundamento para atribuir ao arrematante a responsabilidade pelos tributos pendentes. Contudo, essa exigência não derroga o disposto no CTN, especialmente após o julgamento do Tema Repetitivo 1.134.
A tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça, com trânsito em julgado em dezembro de 2024, foi clara ao afirmar: “Diante do disposto no artigo 130, parágrafo único, do CTN, é inválida a previsão em edital de leilão atribuindo responsabilidade ao arrematante pelos débitos tributários que já incidiam sobre o imóvel na data de sua alienação.”
Assim, resta afastada a alegação de que caberia ao arrematante a responsabilidade pelo débito anterior à hasta pública, uma vez que a suposta ciência inequívoca do ônus, baseada na divulgação do edital do leilão, não se sustenta.
Responsabilidade tributária
Noutro giro, apesar da pacificação dessa tese concernente ao edital, a definição do momento a partir do qual se transmite a responsabilidade tributária ainda é objeto de divergência. Há três possíveis marcos: a do auto de arrematação, a expedição da carta de arrematação ou seu registro na matrícula do imóvel.

Nesse trilhar, conforme o artigo 903 do Código de Processo Civil, a arrematação é perfeita e irretratável com a do auto, mas o domínio somente se transmite com o registro imobiliário. Nesse mesmo sentido, o auto de arrematação configura ato constitutivo da alienação. Lado outro, a carta de arrematação caracteriza título executivo da transmissão da propriedade.
Por conseguinte, na mesma linha de raciocínio, o Superior Tribunal de Justiça pacificou que a transmissão da propriedade imobiliária do bem objeto da arrematação em hasta pública apenas ocorre com o registro da carta de arrematação, nos termos do artigo 1.245 do Código Civil.
Pelo corolário lógico, através do julgamento do REsp 1821815, o STJ definiu que é indevida cobrança de tributos cujos fatos geradores sejam anteriores ao mencionado registro. Na mesma linha, denota-se julgados mais recentes do TJ-SP, através dos acórdãos proferido nos processos nº 1506775-68.2020.8.26.0288 [1] e 1013545-63.2020 .8.26.0053 [2], nos quais determinou-se que a responsabilidade do arrematante por débitos tributários somente se dará após a expedição e registro da carta de arrematação.
Responsabilidade de tributos anteriores à arrematação
Ocorre que, em 2023, no julgamento do REsp 1921489, a 2ª Turma da Corte Superior[3] manteve o acórdão da instância inferior no qual constava: “Assim, se depois de formalizada a arrematação ela é considerada perfeita, ainda que haja morosidade dos mecanismos judiciais na expedição da carta de arrematação, para a devida averbação no RGI, o entendimento é no sentido de que os débitos fiscais deverão ser ados pelo arrematante”. Ressaltou-se, ainda, que a pendência do julgamento do Tema 1.134, à época, não impedia o julgamento da lide, por não se tratar de previsão editalícia, mas de definição do marco para transmissão da responsabilidade tributária.
Fundamentou sua decisão na interpretação da regra contida no artigo 130, parágrafo único, do CTN, que não exime o arrematante da responsabilidade no que concerne aos débitos de IPTU posteriores à arrematação, ainda que postergada a respectiva imissão na posse.
Com o julgamento do Tema 1.134, restou firmada a impossibilidade de imputar ao arrematante a responsabilidade por tributos anteriores à arrematação, independentemente da previsão em edital. Contudo, a definição do marco jurídico de responsabilização continua a depender de interpretação jurisprudencial, oscilando entre a data da arrematação e o registro da carta.
Apesar do posicionamento mais recente coadunar com a primeira hipótese, percebe-se que, até o momento, a tendência majoritária aponta para a prevalência do registro da carta de arrematação como marco para transferência da responsabilidade tributária.
[1] (TJ-SP – Apelação Cível: 15067756820208260288 Ituverava, Relator.: Marcos Soares Machado, Data de Julgamento: 22/07/2024, 15ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 22/07/2024)
[2] (TJ-SP – APL: 10135456320208260053 SP 1013545-63.2020 .8.26.0053, Relator.: Burza Neto, Data de Julgamento: 19/07/2021, 18ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 19/07/2021)
[3] (STJ – AgInt no REsp: 1921489 RJ 2021/0038430-4, Data de Julgamento: 28/02/2023, T2 – SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 07/03/2023)
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