Fiscal da atividade policial, MP deve abrir os olhos para erros de reconhecimento pessoal
11 de outubro de 2024, 18h53
Para ministros do Superior Tribunal de Justiça, o Ministério Público deve abrir os olhos para os problemas decorrentes do reconhecimento pessoal de suspeitos feito em desrespeito ao rito estabelecido pelo artigo 226 do Código de Processo Penal.

Para a ministra Daniela Teixeira, MP precisa abrir os olhos para a questão do reconhecimento pessoal
Essa cobrança foi feita durante o “Seminário Internacional Provas e Justiça Criminal”, sediado pelo STJ na quarta (9/10) e na quinta-feira (10/10), que tratou dos efeitos da Resolução 484/2022 do Conselho Nacional de Justiça sobre o procedimento.
O reconhecimento pessoal é um dos principais fatores causadores de erros judiciários no Brasil. Em 2020, o STJ ou a construir jurisprudência no sentido de anular provas decorrentes desse procedimento quando houver desrespeito às previsões legais.
A ministra Daniela Teixeira citou dados do advogado e pesquisador David Metzker que indicam que, neste ano, o STJ já concedeu a ordem em Habeas Corpus para anular provas por desrespeito ao artigo 226 do P em 174 processos.
Esses casos aram pelas instâncias ordinárias com a concordância dos MPs locais e não precisaram de grandes provas para serem anulados pelo STJ. Deles, 119 tiveram parecer contrário à concessão da ordem pelo Ministério Público Federal (68,3% do total).
Para a ministra, os dados levam a duas conclusões. A primeira é que os ministros do STJ estão julgando com coragem. “Corre-se o risco de massacre midiático”, disse ela. “E mostra que o Ministério Público precisa abrir os olhos para a questão do reconhecimento pessoal.”
Em sua fala, o ministro Antonio Saldanha Palheiro explicou que a guinada jurisprudencial do STJ sobre o tema levou ao fim de uma certa leniência que permitia dar o indevido valor a reconhecimentos de pouca ou nenhuma confiabilidade.
O magistrado disse entender por que a autoridade policial se comportava dessa forma: um mau hábito recorrente e uma maneira de “matar” inquéritos. “Durante muito tempo, a gente (Judiciário) fechou os olhos para isso”, itiu ele. “E tem o Ministério Público.”
“O MP tem o dever de controle externo dos atos da polícia. Ele pediu com muita ênfase que essa atribuição constasse na Constituição de 1988. Ele exigiu e recebeu essa incumbência, que é de muito poder e prestígio, mas tem de transformar isso em situações concretas de atuação”, cobrou Palheiro.

Daniela Favaro defendeu que o MP fomente políticas públicas para suprir deficiências da investigação criminal no Brasil
MP e Polícia
Promotora de Justiça do Ministério Público de São Paulo, Daniela Favaro defendeu que o órgão adote uma persecução penal responsável em busca da verdade real.
Em sua análise, o MP deve fomentar políticas públicas que supram eventuais deficiências responsáveis por comprometer a eficácia das investigações no Brasil. E não deve ficar inerte diante de falhas que poderiam ser corrigidas desde o início.
“Nós não somos corregedores da polícia e nem temos a intenção de ser. O controle externo se faz através de articulação e colaboração com os órgãos policiais, que são os responsáveis por subsidiar o Ministério Público com provas necessárias à propositura da ação penal”, disse ela.
“O controle externo exige que o membro do MP não apenas supervisione se as normas estão sendo seguidas, reduzindo o grau de discricionaridade da atuação policial, como construa em conjunto protocolos de atuação com parâmetros objetivos que identifiquem falhas, proponham alterações e auxiliem a apresentação de modelos que funcionem.”
Responsável pela Secretaria de Cursos de Formação da Academia de Polícia Civil de São Paulo, o delegado de polícia Anderson Giampaoli destacou que a corporação está se empenhando em ensinar como executar o procedimento do reconhecimento pessoal.
Ele citou a Portaria DGP 23/2023, que regulamenta o reconhecimento de pessoas, e defendeu que a investigação seja epistemicamente orientada — ou seja, direcionada ao conhecimento ou ao saber.
“Não podemos jogar o reconhecimento de pessoas fora. Temos de ter cuidado. O artigo 11 da Resolução 484 do CNJ diz que a memória é falível e que o juiz tem de tomar cuidado ao valorar o reconhecimento”, disse ele. “Estamos avançando. Não é o ideal, mas estamos avançando.”
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