Dinheiro penal

Judiciário deve gerir verba de transação penal e suspensão condicional, diz maioria do STF

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17 de maio de 2024, 10h41

O Judiciário é o responsável pela gestão de recursos obtidos por meio de transações penais e suspensões condicionais do processo. Foi o que entendeu a maioria do Plenário do Supremo Tribunal Federal, em um julgamento virtual que se encerra às 23h59 desta sexta-feira (17/5).

CNJ e CJF têm regras para gestão e destinação desses valores

Regras internas do Judiciário atribuem tal função aos próprios Juízos da execução da pena. Isso era contestado pelo Ministério Público.

O debate é quanto ao uso de recursos obtidos em casos de prestação pecuniária aplicada como condição para a transação penal ou para a suspensão condicional do processo.

Na transação penal, o réu e o MP fecham um acordo para cumprir determinadas condições estipuladas pelo próprio MP, em troca do arquivamento do processo.

Já na suspensão condicional, também proposta pelo MP, o réu aceita cumprir algumas condições impostas pelo juiz. O processo é suspenso até que elas sejam cumpridas e depois é extinto.

Contexto

Por meio de ação direta de inconstitucionalidade, a Procuradoria-Geral da República questionou uma resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e outra do Conselho da Justiça Federal (CJF), que determinam o depósito de valores relacionados a esses dois mecanismos na conta judicial da unidade responsável pela execução pena.

A PGR apontou que somente o MP pode propor suspensão condicional do processo e transação penal. Por isso, o Judiciário, que tem apenas o papel de homologar, não poderia definir o destino de valores relacionados a essas hipóteses.

Para a PGR, os conselhos do Judiciário excederam seu poder regulamentar ao estabelecerem regras sobre funções institucionais do MP e a atuação de seus membros.

O órgão ainda ressaltou que a União tem competência privativa para legislar sobre Direito Penal e Processual.

Em 2021, durante uma sessão presencial relativa ao caso, o então procurador-geral da República, Augusto Aras, defendeu que o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) teria mais legitimidade para regulamentar a destinação desses recursos.

Segundo ele, os pagamentos, quando não direcionados às vítimas ou a seus dependentes, devem ser destinados a entidades públicas ou privadas com fins sociais ligados à segurança pública, à educação ou à saúde.

Fundamentação

Prevalece o entendimento do ministro Kassio Nunes Marques, que validou as duas resoluções. Até o momento, ele foi acompanhado por Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Flávio Dino, Dias Toffoli e Cristiano Zanin.

Embora não tenha expressamente acompanhado o relator, o ministro Luiz Edson Fachin também validou as normas, com outros fundamentos semelhantes.

Para Kassio, o Judiciário deve istrar o cumprimento de medidas alternativas à prisão, como as prestações pecuniárias, justamente porque é o responsável por istrar o cumprimento da pena de prisão. Essa primeira função inclui a definição da entidade que vai se beneficiar do dinheiro.

“Por falta de previsão constitucional, não cabe mesmo ao Ministério Público istrar nem disciplinar o destino de recursos que ingressam nos cofres públicos a título de sanção criminal, ou de sucedâneo desta”, assinalou o ministro.

Segundo ele, o MP não poderia definir, por exemplo, o estabelecimento prisional onde um condenado deve cumprir pena. Da mesma forma, não pode definir a entidade beneficiária dos recursos de prestações pecuniárias, “sem que isso signifique efetiva ingerência na istração do cumprimento de uma tal medida alternativa”.

Na sua visão, as resoluções questionadas pela PGR se limitaram a “regulamentar o exercício de uma competência própria do Poder Judiciário, buscando sua uniformização nos tribunais pátrios”.

Por fim, Kassio explicou que a istração do cumprimento das prestações pecuniárias não é tema de Direito Penal ou Processual Penal, mas sim de “regulamentação istrativa”. Por isso, concluiu que não há violação da competência legislativa privativa da União.

Já Fachin concordou com este último argumento e acrescentou que a indicação da aplicação dos recursos não é um elemento essencial da transação penal ou da suspensão condicional. Ele ainda ressaltou que o uso da verba para projetos só é possível quando não for destinada à vítima ou aos seus dependentes.

Voto do relator

Quando a ação começou a ser analisada, em 2020, o relator, ministro Marco Aurélio, declarou que a resolução do CJF é incompatível com a Constituição e estabeleceu que a resolução do CNJ não alcança o uso de verbas fixadas como condição para suspensão condicional de processo ou transação penal.

Embora o magistrado tenha se aposentado no ano seguinte, seu voto permaneceu válido na sessão atual, mas ficou vencido.

Marco Aurélio destacou a competência exclusiva da União para legislar sobre Direito Penal. Para ele, “órgãos estritamente istrativos”, como o CNJ e o CJF, não podem “dispor sobre matéria penal”.

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ADI 5.388

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