STF vai definir se Lei da Anistia vale para sequestro e ocultação de cadáver
15 de fevereiro de 2025, 13h45
O Plenário do Supremo Tribunal Federal vai analisar se a Lei da Anistia também acoberta os chamados “crimes permanentes” cometidos pela ditadura militar, que permanecem até hoje sem solução, como sequestro e ocultação de cadáver. Nesta sexta-feira (14/2), a corte confirmou que o caso tem repercussão geral.

Corte busca decidir se anistia abrange crimes permanentes, que permanecem sem solução até hoje
A decisão que reconheceu a repercussão geral foi unânime. Para definir uma tese, será necessário um novo julgamento. Ainda não há previsão para que isso aconteça.
A Lei de Anistia de 1979, perdoou delitos cometidos por militares durante o regime de exceção. Ela abrange crimes políticos e a eles conexos ocorridos entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979. Crimes permanentes, no entanto, iriam além do período acobertado pela norma, uma vez que eles continuam sendo cometidos.
A repercussão geral da discussão foi proposta pelo ministro Flávio Dino, relator do caso, motivado pelo caso do ex-deputado federal Rubens Paiva. Em dezembro do ano ado, o magistrado se manifestou no sentido de que crimes permanentes não são alcançados pela norma.
“No crime permanente, a ação se protrai no tempo. A aplicação da Lei de Anistia extingue a punibilidade de todos os atos praticados até a sua entrada em vigor. Ocorre que, como a ação se prolonga no tempo, existem atos posteriores à Lei da Anistia”, disse o relator em sua manifestação.
No caso concreto, o Ministério Público Federal denunciou, em 2015, dois tenentes-coronéis do Exército, buscando a condenação por homicídio qualificado e ocultação de cadáver durante a Guerrilha do Araguaia, no começo dos anos 1970.
Crimes de todos os dias
O argumento em prol da continuidade desses crimes não é difícil de entender: se pessoas assassinadas não tiveram o paradeiro revelado, é porque os corpos ainda estão sendo ocultados. Em casos assim, os crimes continuam sendo cometidos todos os dias. Por isso, não seriam alcançados pela Lei de Anistia, e não estariam prescritos.
Esse ponto de vista foi defendido pelo ministro aposentado Celso de Mello, ex-presidente do STF, em reportagem publicada pela revista eletrônica Consultor Jurídico em janeiro.
“Enquanto não se descobrir o local do sepultamento ou, então, enquanto as pessoas criminosamente sequestradas (‘desaparecidas’) não forem encontradas, referidos crimes continuam projetando-se no tempo, precisamente ante o seu caráter de permanência”, afirmou o magistrado.
“No delito permanente (como os crimes de sequestro, cárcere privado, redução à condição análoga à de escravo, ocultação de cadáver, associação criminosa, posse irregular de arma de fogo e organização criminosa, entre outros), a situação de ilicitude penal se protrai no tempo, pois, como assinala o magistério da doutrina, ‘o agente tem o domínio sobre o momento consumativo do crime’”, prosseguiu ele.
Ainda segundo Celso de Mello, não é possível falar em prescrição de crimes permanentes, uma vez que o autor continua em situação de flagrante delito, segundo o artigo 303 do Código de Processo Penal.
“Vejo, bem por isso, como extremamente importante a proposta do eminente ministro Flávio Dino no sentido de o STF reconhecer a existência de repercussão geral a propósito do tema concernente à possibilidade de punição de crimes permanentes, objeto da Lei de Anistia, considerado seu momento consumativo após 15 de agosto de 1979.”
ARE 1.501.674
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